Friday, July 29, 2016

Trabalho forçado na Venezuela

Venezuela: New regime effectively amounts to forced labour (Amnistia Internacional):

A new decree establishing that any employee in Venezuela can be effectively made to work in the country’s fields as a way to fight the current food crisis is unlawful and effectively amounts to forced labour, said Amnesty International. (...)

The decree, officially published earlier this week, establishes that people working in public and private companies can be called upon to join state-sponsored organizations specialized in the production of food. They will be made to work in the new companies temporarily for a minimum of 60 days after which their “contracts” will be automatically renewed for an extra 60-day period or they will be allowed to go back to their original jobs.

Thursday, July 28, 2016

Investigador quer que o ensino superior seja ainda mais selectivo e discriminatório

Investigador diz que ensino superior é “selectivo” e “discriminatório”:

Estudo revela que os casos mais flagrantes acontecem nos cursos de medicina e arquitectura. O especialista defende que a selecção dos alunos deveria ser feita com base não apenas em exames, mas também em entrevistas e exames psicotécnicos. (...)

O sistema de ensino superior português foi criado numa lógica de "massificação e democratização sem igualdade", registando-se uma "sub-representação" das classes mais baixas da sociedade que resulta, em parte, da utilização do numerus clausus como mecanismo único "de selecção", disse à agência Lusa um dos coordenadores do livro "Sucesso e abandono no ensino superior em Portugal" José Manuel Mendes. (...)

Segundo José Manuel Mendes, a selecção dos alunos deveria ser feita com base não apenas em exames, mas também em entrevistas e exames psicotécnicos, "como se faz noutros países", de forma a tentar garantir uma "melhor representação da sociedade" no universo de estudantes que frequenta o ensino superior.
O diagnóstico provavelmente estará certo, mas a solução proposta é absurda - meios de seleção como entrevistas e psicotécnicos, que escolhem os candidatos com base na sua personalidade e não (apenas) com base nas notas, são ainda mais discriminatórios, já que se baseiam abertamente em escolher pessoas com uma dada personalidade, maneira de ser, etc., e não pessoas com outra. E numa altura em que tanto se fala das vantagens da "diversidade", escolher alunos com base na sua personalidade (o que obviamente implica preferir umas personalidades a outras) e não com base nas suas notas parece-me ainda mais um contrasenso.

E mesmo de acordo com o problema específico que o estudo refere, a discriminação com base na classe social de origem, suspeito que isso ainda o iria agravar - se há uma ligação entre as notas no secundário e a classe social de origem, também o há largamente (se calhar ainda mais) entre a personalidade e a classe social de origem, com a agravante que é mais fácil subir as notas com esforço e dedicação do que mudar de personalidade com esforço e dedicação.

Quando leio artigos ou vejo filmes sobre o processo de admissão nas universidades norte-americanas, com aqueles rituais bizarros (as entrevistas, as cartas de recomendação dos professores, os alunos que fazem atividades extracurriculares no secundário porque fica bem no curriculum, etc.), e as polémicas associadas sobre se o sistema beneficia uns grupos ou outros, eu costumo pensar "mas porque é que eles não fazem como os países civilizados e não escolhem os alunos de acordo com as notas num exame, sem dar hipótese aos responsáveis das universidades de - mesmo inconscientemente - discriminarem de acordo com as suas preferências subjetivas?"; mas pelos visto há quem ache o contrário e pretenda americanizar o ensino superior português (no caso dos EUA, penso que está mais ou menos provado que o motivo original de terem adotado esse sistema foi como uma forma de limitar o acesso às universidades de grupos étnicos cujo desempenho académico era largamente superior ao seu prestígio social na altura - leia-se "judeus" - e manteve-se depois por inércia, e também porque é mais fácil com um sistema desses meter pela "porta do cavalo" filhos de pessoas que dão grandes doações à universidade, ou de antigos alunos famosos).

Mas, já que se pretende copiar americanices, se o objetivo é limitar a discriminação por classe social, seria melhor ideia copiar o sistema de admissão da Universidade do Texas, em que (com alguns limites) os 10% melhores alunos de cada escola secundária têm automaticamente entrada assegurada na universidade (em termos portugueses, isso quereria dizer que entravam tanto os 10% melhores alunos da Escola Secundária do Restelo como os 10% melhores alunos da Escola Secundária da Baixa da Banheira).

[Post publicado no Vias de Facto; podem comentar lá]

Thursday, July 21, 2016

O que é o "ordoliberalismo"?

Francisco LouçãVital Moreira e João Rodrigues andam a discutir o que é ou não é o "ordoliberalismo".

A minha opinião (tomando como referência sobretudo o livro A Humane Economy, de Wilhelm Röpke) - o ordoliberalismo parece-me uma teoria que combina posições microeconómicas não muito diferentes das de economistas de centro-esquerda como Paul Samuelson, defendendo a intervenção do estado para combater as falhas de mercado (no caso dos ordoliberais, com uma grande ênfase na defesa da concorrência), com posições macroeconómicas à direita de Milton Friedman, defendendo entusiasticamente orçamentos equilibrados e uma politica monetária restritiva (pelo menos no caso de Röpke, com alguma simpatia pelo padrão-ouro). Talvez seja o mais parecido que existe com o "estatismo não-keynesiano" que falo aqui. E, realmente, a política da UE é capaz de andar perto disso - muitas vezes com aparentemente excessiva microregulação e ao mesmo tempo com politicas macroeconómicas bastante restritivas (o que parece contraditório se vermos numa perspetiva estatismo vs. liberalismo, mas já faz mais sentido numa perspetiva regras vs. flexibilidade).

Eu aliás diria que a visão económica dos ordoliberais não pode ser dissociada de uma visão social mais ampla (aliás, creio que um dos aspetos do ordoliberalismo é considerar que a economia não pode ser vista dissociada do conjunto da sociedade) - creio que a ideia dos ordoliberais é um mundo de pequenas e médias localidades e pequenas e médias empresas, com famílias coesas, trabalhadoras e poupadas (Röpke até criticava as compras a prestações), desconfiando simultaneamente do grande capital, do consumismo e do despesismo estatal.

Isto que vou sugerir agora já é uma hipótese altamente especulativa, mas talvez o ordoliberalismo possa ser considerado como sendo, pela direita, um dos herdeiros do romantismo alemão, sendo o outro, pela esquerda, os Verdes (diga-se que o tal livro de Röpke tem uma série de páginas que se tivessem sido escritas uns 20 anos depois quase que poderiam ser de um "verde", lamentando a destruição da natureza pela industrialização - embora provavelmente o "verde" não concluísse o lamento, como Röpke, escrevendo que o único sítio no mundo moderno em que se podia encontrar tranquilidade era numa igreja).

[Post publicado no Vias de Facto; podem comentar lá]

Tuesday, July 19, 2016

Dani Rodrik sobre o golpe na Turquia

Turkey’s Baffling Coup, por Dani Rodrik.

Para quem não saiba, Dani Rodrik é um economista turco a trabalhar e viver nos EUA; durante anos o seu sogro (um general do exército) esteve preso acusado de preparar um golpe contra Erdogan[pdf].

O Pokemon Go

É ridícula a moda de andarem a caçar pokemons imaginários, em vez de, p.ex. ficarem a ver/ler detetives imaginários desvendarem assassínios imaginários, ou espadachins imaginários a enfrentar conspirações imaginárias.

Thursday, July 14, 2016

Um jornalista conservador na prisão com o Black Lives Matter

What Happens When a Breitbart Reporter Goes to Jail, por Jesse Walker (Reason):

Lee Stranahan of the right-wing website Breitbart was arrested Saturday night while covering a protest against police abuses in Baton Rouge. (...) Stranahan—a writer not generally predisposed to side with protesters—subsequently declared on Twitter that he "not only [believes] my imprisonment was unconstitutional but I believe the other protesters['] was as well."

Now Stranahan has published a nearly 3,500-word account of his detention. While it's safe to say that he hasn't been converted to the Black Lives Matter cause, he also writes without malice about the people he was detained with:
We had a lot of time to kill, and I had some great conversations. I quickly learned that the issue here in Baton Rouge for these people was not ideologically driven. Over and over, they told me the issue was not about Democrat or Republican but about the way law enforcement handles things in both Baton Rouge and the state of Louisiana in general, which has one of the largest incarceration rates in Western civilization. These protesters did not have the agenda of overthrowing capitalism that many of the top leaders of Black Lives Matter have; they want police abuse to end, and they see the Alton Sterling case as emblematic of that problem. (...)

I'm pretty sure this is the first time any article in Breitbart has included the phrase "thank God for the National Lawyers Guild"—that being the leftist organization that eventually got the group out of jail. "Do I wish there was a conservative, pro-liberty legal group out there that I could've called?" Stranahan writes. "You're darn right I do, but there was no such group involved in what was going on in Baton Rouge."

Ainda as estatísticas irlandesas

The Irish National Accounts: Towards some do’s and don’ts, por Patrick Honohan (The Irish Economy):

 The statistical distortions created by the impact on the Irish National Accounts of the global assets and activities of a handful of large multinational corporations have now become so large as to make a mockery of conventional uses of Irish GDP.

1. GNP is now almost as unhelpful an aggregate economic measure for Ireland as GDP. (This is due to a change in the way in which some globalized countries are managing their affairs, with some significant global headquarters now being located to Ireland)

2. Ratios to GDP are now almost meaningless for Ireland in most contexts. They need to be supplemented by alternative purpose-constructed ratios for specific uses, as the Irish Fiscal Advisory Council already proposed a few years ago with its weighted average of GDP and GNP for assessing fiscal sustainability – though that particular solution will no longer work well for the reason mentioned in point 1.

3. International statistical conventions should be revisited to help the interpretation of the data in a world where huge MNCs, legally controlled from small jurisdictions are moving assets around on this scale. (...)

4. Some of the big aggregates of the national accounts are largely unaffected by the distortions. For instance, the figures for personal expenditure on consumer goods and services and for government expenditure on goods and services. These two series can still be used to get a more realistic picture of the recovery as it is felt in public and private consumption. But they should not be expressed as a percentage of GDP, but instead in real constant price terms, seasonally adjusted. (...)

Thus, by the first quarter of 2016, personal expenditure was still just below its quarterly peak of eight years ago; it has been growing for twelve quarters since the trough at an annual average rate of 3.5%.
Government spending on goods and services (i.e. not including transfer payments) in the first quarter of 2016 was still six per cent below peak but has grown by 4.0% per annum on average in those twelve quarters. (...)

How do these recent growth rates in consumer and government spending compare with those registered in the decade before the bust? Much lower of course: consumer spending rose by an average of 5.6% per annum 1998-2008, and government spending by 4.9%. Recovery yes: boom no.

Tuesday, July 12, 2016

Crescimento económico irlandês - verdade ou farsa?

The farce of Ireland’s national accounts: let’s go plane watching!, por Aidan Regan (The Irish Economy):

Wow! Exports are up 34%; Investment is up 27%; imports are up 22%. Wham, bam, the economy grew by 26%. Sensational. (...)

The increase in investment, although you can’t see it in the national accounts, is being driven by airline leasing. My hunch is that this has increased by about 110%. Airline companies of the world are effectively transferring their financial activities (as new aircraft machinery) into Ireland for tax purposes. As a student of mine nicely put it: imagine all those massive Boeing planes flying around the world, then imagine them in Ireland, and hundreds of people working on them (...)

The increase in exports, although more real, and somewhat more complicated, is a result of a similar dynamic. It’s large corporations transferring assets and IP patents into Ireland – with no real connection to employment – and then booking it as real investment, for tax purposes. There can be no doubt Ireland has an export-led economy, and this is being driven by US FDI. But these massive jumps in growth are not linked to real goods/services. They shouldn’t be in the GDP figures.

The 26.3% makes for a great media headline. But if the media want to go find this growth, they might as well go plane watching at Dublin airport. It’s a farce. There is simply no credibility to the national accounts. Most serious observers looking in at Ireland, know this. And this is what should really concern the government and civil servants.

Bullying "homofóbico"?

Ontem, li numa rede social uma referência a um caso descrito como "bullying homofóbico":

Aluno morre em sala de aula durante sessão de bullying homofóbico:

De acordo com testemunhas, o jovemS ergei Casper, de 17 anos, era visto como um garoto diferente dos demais. Na maioria dos casos, essas pessoas são consideradas alvos prediletos dos praticantes de bullying. O jovem Gasper gostava de cantar, ouvir música, além de ser fã de artes. Era considerado um rapaz calmo, mesmo assim, durante muito tempo, ouviu muitas piadas a seu respeito por ser considerado gay pela maioria dos colegas.
Menino de 11 anos tenta suicídio após bullying homofóbico:
Michael Morones, 11, tentou se matar depois de sofrer bullying homofóbico na escola.
O garoto, que tentou se enforcar, foi encontrado pelos pais desmaiado em seu quarto.
Segundo os médicos, como o cérebro ficou muito tempo sem receber oxigênio, a criança pode ter graves sequelas. A mãe de Michael, Tiffany Morones, disse que o motivo do bullying era o fato de Michael ser fã do desenho “My Little Pony: Friendship is Magic” (Meu Pequeno Ponei: A amizade é mágica). Por conta disso, os colegas de Michael o chamavam de gay.
Tiffany disse que o garoto já se queixava há algum tempo e que estava cansado de ser humilhado todos os dias na escola.
Apesar de tudo, a mãe de Michael declarou que não vai atrás dos colegas que levaram o seu filho a tentar cometer suicídio.
Qual é o meu ponto? É que interrogo-me se "homofóbico" é mesmo o termo mais adequado - pelo que percebo, eles não eram perseguidos pelos colegas por causa da sua orientação sexual (que, pelas notícias, nem se sabe qual é), eram perseguidos simplesmente por terem passatempos considerados estereotipicamente "de menina". Poderá se argumentar que o bullying poderia não ser objetivamente homofóbico, mas seria-o subjetivamente, já que os colegas perseguiriam-nos por julgarem que eles eram homossexuais, mas nem isso me parece que seja assim tão linear (seria mesmo só por acharem que era um indício de homossexualidade que perseguiam colegas com interesses artísticos ou fãs do "Meu Pequeno Pónei"? Ou será que era parte de um padrão geral de desprezo por tudo o que não fosse "macho", mesmo independentemente da orientação sexual? Aliás, no segundo caso, nem sequer me parece claro que os colegas achassem realmente que ele fosse homossexual).

Diga-se que há uns tempos atrás vi uma notícia em que falava de bullying homofóbico no ensino primário; como era uma notícia "fechada", só li o título, mas fiquei na dúvida se seria realmente uma notícia sobre crianças do ensino primário que era vítimas de bullying por sentirem atração por pessoas do mesmo sexo, ou se muitos dos casos seriam (atendendo que estamos a falar de idades em que até nem será muito frequente manifestar-se atração seja por quem for) situações de rapazes que preferem jogar ao elástico com as raparigas em vez de andar à luta ou jogar à bola com os outros rapazes, e que por isso são chamados pelos outros de "maricas" e termos similares (sim, é bullying, mas será "homofóbico"?).

É verdade que há aqui um potencial problema - é que não há, que eu saiba, uma palavra para designar "preconceito contra homens com interesses não estereotipicamente masculinos" ("machobetafobia"?).

Monday, July 04, 2016

Sobre o atentado no Bangladesh

Razib Khan (Gene Expression):

Apparently the attackers were educated at an English immersion school of some sort. Spoken Bengali, like British English, is very sharply differentiated by class. The menial workers at the bakery were apparently surprised at the obviously upper middle class speech patterns of the terrorists, as well as the fact that some of them spoke casually in English.
This is not surprising. Terrorist ideologues are often from privileged backgrounds.Marc Sageman has presented the most thorough ethnographies that I know of, and they’re rather clear. Generally middle to upper class, often with a technical background. Also a disproportionate number of converts. Many people with cosmopolitan backgrounds, in term of having exposure to other cultures and traveling.
As for why radicalism is cropping up in Bangladesh, it’s because they know that they’re in the middle of a culture war they might lose. There are atheists and gays in most countries, but in Bangladesh they are starting to be public. That’s a sign that the norms of conservative Islam are breaking down. Additionally, economic development and NGO influence are also integrating the nation into a web of international commerce.