Wednesday, October 03, 2012

depósito, moeda e crédito - parte I

MM escreveu "Pelo que tenho visto, nomeadamente pelos textos que o Carlos Novais tem escrito sobre o assunto, grande parte da objecção tem a ver com o que consideram a fraude implícita em chamar "depósito" a algo que não é realmente um depósito; logo, como os fundos e outros produtos financeiros que Krugman refere não se dizem "depósitos", não haveria problema por aí.

No entanto, com ou sem fraude, o problema de que a reserva bancária fracional criaria ciclos económicos manteria-se à mesma, parece-me; imaginemos que os bancos deixavam de chamar aos depósitos à ordem "depósitos à ordem" e passavam a chamá-los "aplicações financeiras liquidáveis a pedido" - todas as consequências económicas que supostamente a existência de depósitos à ordem (não garantidos a 100%) têm continuariam a ter, mesmo com o novo nome."

Para o melhor entendimento do que está em jogo e tentando (re)construir uma argumentação por passos sucessivos:


1. Depósito civil significa, de forma corrente, a pessoa dar (contratar o serviço) à  guarda a uma entidade depositária a coisa depositada, e isso inclui, bens homogéneos que podem ser armazenados em conjunto para vários depositantes. A entidade depositária tem assim de manter à sua guarda, fisicamente, a totalidade das coisas depositadas, cobrando possivelmente uma comissão por esse serviço.

2. Antes não existiam leis bancárias especiais e era o direito digamos geral que prevalecia e assim podemos intuir que no acto de depósito, a coisa tem de permanecer depositada. O depósito de moedas e barras de ouro era legitimamente entendido como a contratação do serviço de um depósito com possibilidade de levantamento imediato.

3. Ao mesmo tempo, os contratos de crédito são conhecidos desde tempo imemoriais e eram praticados por quem tinha acumulado ouro e prata, ou seja, utilizavam capital próprio para conceder crédito.

4. As entidades depositárias com o tempo, começaram a organizar-se e baixar o custo de manuseamento da moeda, contabilizando e emitindo:

- Notas que representavam ouro depositado pelo emitente dessa nota, e que circulavam em vez da moeda física.
- Contas correntes com movimentos de débito e crédito, possibilitando que movimentos possam ser feitos entre contas, o crédito de certa quantidade de ouro ou prata numa dada conta corresponde a um débito da mesma quantidade de ouro ou prata noutra conta corrente.

5. Existem historicamente casos em que existe a absoluta certeza que assim era, sendo o Banco de Amsterdão, criado em 1609,  um caso desses.

6. Assim sendo, o acto de crédito dá-se da única forma que as pessoas em geral pensam ser possível: para alguém receber moeda de empréstimo, outra se dispõe a deixar de ter na sua posse por igual período de tempo essa quantidade de moeda (ouro ou prata físico à guarda). O acto de crédito significa a poupança monetária prévia de alguém a troco de um juro.

7. Os Bancos, para além de entidades depositárias, serviam com intermediários entre possuidores de poupança monetária e quem a procura como crédito. Uma pessoa detentora de moeda concede crédito ao banco por x tempo e cobrando uma dada taxa de juro e o Banco concede crédito a uma taxa de juro superior, constituindo a diferença a sua margem.

Situação 1:

Entidade A -> Conta corrente: 100 moedas
Entidade B  -> Conta corrente: 0 moedas

Isto corresponde a esta representação do Balanço do Banco:

Activo do Banco:

Cofre com moedas armazenadas: 100 moedas de ouro

Passivo do Banco:

Conta corrente da Entidade A: 100 moedas de ouro
Conta corrente da entidade B: 0 moedas de ouro

__________________________________

Situação 2: Crédito de A ao Banco e Crédito do Banco a B -> situação final

Entidade A -> Conta corrente: 50 moedas + Conta crédito ao Banco: 50 moedas
Entidade B  -> Conta corrente: 50 moedas

Isto corresponde a esta representação do Balanço do Banco:

Activo do Banco:

Cofre com moedas armazenadas: 100 moedas de ouro
Crédito à entidade B: 50 moedas de ouro

Passivo do Banco:

Conta corrente da Entidade A: 50 moedas de ouro
Conta corrente da entidade B: 50 moedas de ouro
Conta depósito a prazo da Entidade A: 50 moedas de ouro

O total de moeda a circular continua a ser 100 moedas. Claro que o próprio capital próprio do Banco pode servir para conceder crédito. O Banco pode assim naturalmente conceder crédito com a sua própria moeda que constituía a entrada de capital pelos accionistas. Mas importa aqui analisar o acto de intermediação .

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