Thursday, July 13, 2006

Ainda sobre CO2

Há uns tempos, Luis Pedro apresentava uma série de posições que o "espaço à direita do PS" poderia tomar. Uma delas, até a mim (aqui no "espaço à esquerda do PS") me pareceu uma boa ideia: que as licenças para emissão de CO2 deveriam ser leiloadas e não distribuidas por decisão politica.

À partida, parece daquelas medidas inatacáveis, já que até atinge dois objectivos muitas vezes em conflito: maior equidade e maior eficiência.

Essa medida aumentaria a equidade por duas razões: por um lado, as empresas mais poluidoras teriam que pagar (ou pagar mais - não sei se actualmente pagam alguma coisa) para poderem poluir, o que, em principio, até significaria que os "ricos" iriam contribuir mais para o Orçamento (claro que as receitas desse leilão poderiam ser usadas de muitas formas distintas: para reduzir os impostos, ou para financiar mais serviços públicos, ou serem distribuidas por toda a gente como um "dividendo do cidadão", etc.); além disso, também seria mais "equitativa" por outra razão - os "candidatos a poluidores", de certa forma, ficariam em mais "igualdade" entre eles, já que as licenças de poluição já não seriam atribuidas por decisões arbitrárias do governo (digamos que nos aproximavamos tanto da "equidade socialista" - igualdade de rendimentos - como da "equidade liberal" - igualdade apenas perante a lei)

Em termos de eficiência, essa medida também seria positiva: por leilão, é muito mais provavel que as licenças sejam concedidas ao projectos mais eficientes (já que os projectos de investimento que consigam produzir mais rendimento por cada unidade de CO2 emitido serão os que estão dispostos a pagar mais pelas licenças).

Só vejo um problema possível no sistema de leilão: é que uma empresa com muito dinheiro poderia comprar as licenças de emissão todas para asfixiar (quase literalmente) a concorrência e obter um poder de monopólio, mas duvido que este cenário seja realista actualmente.

Portanto, uma medida que estimularia tanto a eficiência como a equidade (e esta, tanto no sentido "socialista" como "liberal") deveria ter montes de defensores por todo o espectro politico. Porque é que isso não acontece? Tenho uma teoria: é que quando se fala em "pôr as empresas a pagar" ou em "substituir decisões politicas por mecanismos de mercado" há muita gente (à direita e à esquerda, respectivamente) que automaticamente "puxa de uma pistola".

11 comments:

Anonymous said...

Obrigado pelo elogio.

Quanto ao cenário de uma única entidade monopolizar todas as licensas, é um bocado como imaginar que alguém podia comprar todos os espaços lojistas de uma cidade: Teoricamente possível, mas quem é que tinha tanto dinheiro para gastar nisto, quando provavelmente até seria um mau investimento?

Anonymous said...

é teoricamente possivel e na pratica tambem.

eu tenho um caso muito proximo de uma pessoa que está a comprar uma rua inteira para arendamento. só faltam algumas casas.
por outro lado, existem em portugal empresas com essa capacidade.
até que ponto as pequenas e medias empresas iam sofrer com isso?

de resto, esta contradição eficiencia/poluição não é tão linear.

continuo a achar que deve ser por via de redução de impostos. assim é bom para todos.

Anonymous said...

sabe-se muito bem que muitas vezes fica mais barato poluir, do que investir em metodos que aumentem a eficiencia.

Miguel Madeira said...

por outro lado, existem em portugal empresas com essa capacidade."

Pois, mas se calhar esse "açambarcamento" da atmosfera só seria rentável se fosse feito à escala mundial.

Além disso, se os proveitos desses leilões fossem distribuídos igualitariamente por toda a gente (o tal “dividendo do cidadão”), talvez, mesmo em teoria, a monopolização fosse impossível: para comprar as licenças todas, seria preciso oferecer um preço altíssimo por cada licença, logo (em termos relativos) o "dividendo" distribuido também seria alto, dando às outras pessoas capacidade financeira para lhe fazerem concorrência nos leilões posteriores.

Anonymous said...

não tenho nada contra o leilão, bem pelo contrario.
o mercado e o socialismo não são contrarios.

leilões anuais não eram má ideia, mas nestas questões deve haver um tempo a titulo de experiencia.
a teoria é uma coisa e a practica outra.
segundo o que está a dizer as coisas iam funcionar mais ou menos como o imposto de carro, onde os que poluem mais tem de pagar mais.

penso é que devem haver, talvez, mecanismos adicionais.

Anonymous said...

Uma rua inteira é possível ter um único proprietário, até um bairro inteiro (um centro comercial não é mais do que um bairro privado). Agora, uma cidade inteira não penso que faça sequer sentido.

Sobretudo porque à medida que a pessoa fosse comprando a cidade, cada casa seguinte ficava mais cara (porque a oferta se tornava menor). No final, as últimas casas seriam quase impossíveis de comprar. Esta é uma das justificações para se usar expropriações em grandes projectos: é que, em mercado aberto, pode ser muito difícil, ou mesmo impossível, comprar tudo.

Isto admitindo que interessaria a alguém comprar todos os direitos de emissão o que acho que é um falso medo.

Além disso, "comprar para arrendar" não é o mesmo do que "comprar para retirar do mercado" que era o perigo apontado.

Se for mais caro para uma determinada empresa reduzir as emissões do que comprar direitos, compre-se direitos. Desde que o número total de licenças seja limitado, isso não é problema nenhum, porque implica que noutro lugar qualquer há alguém a poluir menos.

Anonymous said...

Queria só acrescentar que isto não é inventar nada: o sistema de emission trading está em funcionamento nos EUA para SO_2 e NO onde é muito livre (inclusive grupos ambientalistas compram licenças que depois não usam para descer as emissões e fazer subir os preços) é considerado como um programa bem sucedido, tendo vindo a conseguir uma redução progressiva, mas sustentada das emissões sem grandes custos económicos.

Anonymous said...

tudo bem.

eu só espero que aqui os grupos ambientalistas não sejam acusados de manipular ou serem prejudiciais ao mercado, pois depois das declarações de determinadas pessoas, só falta ilegalizar os movimentos ambientalistas.


como eu disse, no fundo quem polui mais paga. não é muito diferente da logica do imposto.

os leilões são anuais?

Anonymous said...

para ser sincero, ainda bem que isto não se aplica aos recursos hidricos.
o objectivo final deve ser como nos recursos hidricos: poluição zero.

Anonymous said...

"Além disso, "comprar para arrendar" não é o mesmo do que "comprar para retirar do mercado" que era o perigo apontado."

pois claro, mas é muitissimo melhor para todos que o ar atmosferico continue na coisa publica.

felizmente o ar atmosferico ainda é publico. como a água alias.

e aqui é que possivelmente há muitas divergencias.

Anonymous said...

outro ponto, e este é que causa divergencias.

o ar atmosferico deve ser coisa publica, assim como a agua.