Alguns dos meus amigos do Facebook têm partilhado o artigo "The Internet Arguing Checklist", que argumenta que a esquerda (ou os "liberals") costuma argumentar na internet usando os seguintes "truques":
SKIM UNTIL OFFENDEDDiga-se que alguns desses supostos pontos parecem-me muito semelhentes - p.ex., o "disqualify that opinion" é quase a mesma coisa que o "attack, attack, attack" (acho que há uma diferença: o "disqualify that opinion" é outro nome para a falácia do ad hominem - "a sua opinião está errada porque você é idiota/perverso/um agente pago do grande capital/fanático religioso/etc."; já o "attack, attack, attack" cobre o ad hominem mas também outras formas de argumento, como "a sua opinião está errada e, além disso, você é idiota/perverso/um agente pago do grande capital/fanático religioso/etc." ou "a sua opinião está errada porque [explicação do erro], logo você é idiota/perverso/um agente pago do grande capital/fanático religioso/etc.")
A poo flinging monkey never actually reads their opponent’s article (That could introduce them to dangerous badthink!). Instead they simply skim down the page until finding something that they can loudly proclaim you were offended by. (...)
DISQUALIFY THAT OPINION
This one is lots of fun. Liberals never want to argue ABOUT a topic. They want to argue about why your opinion on that topic doesn’t count. It doesn’t matter who or what you are, there is some reason that your opinion doesn’t count, and it doesn’t have to make sense. (...)
ATTACK, ATTACK, ATTACK
The dumbest of poo flingers must find something, anything about their opponent and attack it rather than the actual topic or salient points. Too tall, too short, too fat, too thin, nothing is off the table. I watched one on Facebook where one of my fans disagreed with a lib about Obamacare, and was attacked because of their profile picture “your kid looks retarded.” And yes, their kid was handicapped, but that’s what you get with caring liberals. (...)
DISREGARD INCONVENIENT FACTS
This one is really self-explanatory. It goes hand in hand with our next item on the checklist of Make Shit Up. So you see a liberal post something false. You post the truth. They ignore it. Say that you post a link to an article. They will find a reason to dismiss it. “The Drudge Report? That’s not a *real* newspaper!” So you post the same story from when the WaPo got around to finally copying Drudge a month later. They ignore it.
MAKE SHIT UP
This one can get pretty crazy , but if they’ve made it this far down the checklist things are getting desperate, might as well go for the gold.
There are a few levels of this. The easiest one is taking the most absurd batshit insane person they can on the right and putting them as our poster child “Republicans don’t believe in dinosaurs and think the earth is flat and religious people hate science and homeschooling will make children into racist bigots who wage a war on women stay out of my vagina!” This is your usual straw man stuff. Fairly typical.(...)
RESORT TO MORAL EQUIVALENCY
Find something, anything bad as done by a liberal? “Well, republicans did it too!” Did the president do something stupid? “It is Bush’s fault.” So? Was it okay then? No. Then it shouldn’t be okay now, hypocrite. And of everything on the checklist, this is the one that I’ve seen people on the right be guilty of the most often. Do republicans suck too? Hell yes. They’re pathetic (most often when they’re trying to be democrat lite, oh, freaking retire already, John McCain). So sometimes this is totally true. (...)
CONCERN TROLLING
A personal favorite. There are two types. The classic Concern Troll and the Boycotter.
Concern Trolling is a tool to enforce the illusion of monolithic group think where the liberal responds like they care. They care so hard about you, poor misguided right winger, and they care that you are saying these horrible, nasty, awful, racist, mean, things. What will everyone think of you? What would your friends think if they knew that you don’t like giving a third of your income to support crack whores? Why, they’d think you were a horrible person. (...)
The Boycotter is rather specialized Concern Troll that usually only gets used on those of us who have some sort of public persona, like entertainers or business people. Because the left absolutely hates dissent, they will try to squish anyone who gets out of line.
“I came to your blog/facebook/twitter because I’m SOOOO very interested in your book/movie/product, but then I found out what a horrible, awful person you are, so now I’m never going to buy any of your stuff ever again. You should totally never share your badthink again because it will totally scare away the legions of people like me and you’ll starve in a ditch.” (...)
WHEN ALL ELSE FAILS, RACISM!
The most obvious one of them all, because if you are going to argue with liberals you WILL be called racist. It is inevitable. However that is good, because it means you just won. It is the final line on our checklist for a reason. Just keep in mind that you’re in good company. Charlton Heston marched across the Selma Bridge with Martin Luther King, and he was smeared as racist for believing that the 2nd Amendment applied to everyone equally.
Isso será mesmo típico da argumentação da esquerda (se não for, quer dizer que o autor está recorrendo ao "disregard incovenient facts" e/ou ao "make shit up")? E, se for, será mais típico da esquerda do que da direita (e aqui sou eu a recorrer ao "moral equivalence")?
Para testar, fui pegar nos que eram ontem há noite os 3 primeiros posts do Esquerda Republicana, do Jugular, dos Ladrões de Bicicletas, do Blasfémias, do Estado Sentido e do Insurgente, deixando de lado aqueles que são só links, videos, comentários de um linha, ou posts contra-intuitivos (estilo um blogue de esquerda a contestar uma opinião que até é mais comum na esquerda, como aqui).
Esquerda Republicana:
O shift de Hillary
Sturm und drang=Trump with a bang
Aquilo que apreciei na actuação do Governo
Jugular:
Pode, claro que pode JMT
just kidding?
O que NÃO se pode fazer (era para ser este, mas depois concluí que também era simplesmente pouco diferente de um comentário de uma linha)
Ladrões de Bicicletas:
Linhas vermelhas?
Debater, debater, debater sempre
Estaremos à altura deste desafio?
Blasfémias:
Reviver o passado no Contraditório
uma atitude
O tabu (era inicialmente para ser este, mas depois concluí que também era simplesmente pouco diferente de um comentário de uma linha; este deixei passar porque poderia ser considerado posição contra-intuitiva)
Estado Sentido:
Medina Led
Make Portugal great again?
Tal como dantes...
O Insurgente:
auf wiedersehen?
Todos os fascistas são gordos
O que falta às escolas
O ponto "When all else fails, racism!" precisará de ser "localizado" - em Portugal é mais provável uma acusação de fascismo, salazarismo ou homofobia do que racismo, logo esses poderiam ser todos incluidos; e para uma comparação terá que se ter uma situação equivalente usada à direita; talvez "comunismo", diretamente ou com alguma referencia aos países de leste - mas e se o destinatário for efetivamente um comunista assumido? Para complicar ainda mais, e se for um trotskista, um comunista de conselhos, um anarco-comunista, etc, isto é, um auto-proclamado comunista hostil aquilo que no século XX ficou conhecido como "comunismo"? No entanto, como penso que há poucos comunistas ortodoxos no debate internético, penso que podermos considerar acusações à direita de "comunismo" - nestas palavras ou falando algo como "na URSS era assim" como equivalentes (a menos que usadas mesmo contra um comunista ortodoxo).
É discutível se textos irónicos (como este) deve valer, mas acho que sim - é verdade que são mais complicados de analisar, já que é preciso fazer uma inferência do que o autor quer dizer e vez de fazer uma leitura literal): mas por outro ignorar os posts irónicos iria distorcer as coisas, até porque me dá a ideia que à direita se usa mais o post irónico do que à esquerda (às vezes parece-me que o Blasfémias é quase só posts irónicos), logo ignorá-los iria fazer com que se perdesse esse aspeto (o post irónico muitas vezes é uma manifestação de "attack, attack, attack" - gozar com o adversário em vez de refutar os seus argumentos). Um aparte, ainda a respeito dos posts irónicos - tenho uma suspeita que o tipo "gozão" é mais comum na direita e o tipo "intelectual macambúzio" na esquerda (aliás, sobretudo se cruzarmos com as teorias que dizem que há uma ligação entre a personalidade e o tipo físico, é capaz de não andar longe de algumas observações, mesmo que irónicas, do post em questão).
Ou melhor, este era o meu plano inicial, mas entretanto desisti de avaliar as características "skim until ofended", "disregard incovenient facts" e "make shit-up"; por diferentes razões, são todas complicadas de avaliar - o "make shit-up" implicava eu ir fazer um fact-check a tudo o que fosse lá dito nos posts (coisa que não me apetece), o "disregard inconvenient facts" implica estar a seguir em pormenor a evolução de discussões e teria sempre uma avaliação subjetiva (p.ex., eu não considero que ignorar artigos do Infowars seja "disregard incovenient facts", e aposto que muita gente também não o considerará para ignorar artigos do Libcom ou do Esquerda.net, ou talvez mesmo do Público ou do New York Times); avaliar o "skim until ofended" pode implicar quase telepatia - se uma pessoa critica só parte de um artigo, p.ex., está a praticar "skim until ofended", ou está a criticar o que acha digno de critica e a deixar em paz o resto? Já agora, reconheço que eu sou muito dado a algo que pode ser considerado "skim until ofended" - alguém escrever um texto enorme e eu ir escolher um bocadinho para criticar (muitos dos comentário que faço n'O Insurgente, p.ex., são assim).
Finalmente, muitos desses pontos não são fáceis de detetar em textos que não sejam resposta a outros (talvez eu devesse ter limitado o estudo a post escritos em resposta a alguma coisa?), pelo que no fim vou fazer uma sub-análise envolvendo só "textos resposta".
Mãos à obra:
O shift de Hillary - não me parece ter nenhum dos pontos
Sturm und drang=Trump with a bang - tem "moral equivalence" ("E incrivelmente, foi considerada mais corrupta a candidata que apenas usou um servidor de email privado do que o candidato que assumiu em debates ser praticamente um evasor fiscal"), "attack, attack, attack" (chamar "bojardas" a algumas afirmações de Trump) e talvez referencias a "racism" ou afins ("o voto em Trump (...) foi mais directamente motivado pela rejeição da imigração"); eu digo "talvez" porque as questões da imigração eram mesmo parte do programa de Trump (logo não faria grande sentido não referir isso), mas na dúvida vou contar
Aquilo que apreciei na actuação do Governo - não me parece ter nehum dos pontos
Pode, claro que pode JMT - acho que tem "attack, attack, attack" ("tudo o que ele quiser ou puder, até parvo"), "disqualify that opinion" ("Alguém informe aí o JMT, por favor") e "concerned trolling" ("acredito que informado, em sendo esclarecido, não dirá disparates")
just kidding? - "racism" ("Trump ganhou porque apelou aos sentimentos mais egoístas, nacionalistas e intolerantes de cada eleitor", "Foi dada licença para a discriminação aberta e às claras, para o menosprezo pelas mulheres, para o renascimento da hostilidade contra imigrantes, afroamericanos, latinos, não-cristãos. Está lançado o apelo aos ataques racistas, homofóbicos ou misóginos")
O que NÃO se pode fazer - "attack, attack, attack" ("Esta entrevista é uma vergonha"), talvez "disqualify that opinion" ("Muita, muita asneira")
Linhas vermelhas? - não me parece ter nenhum dos pontos; sim fala em racismo, xenofobia, etc., mas consegue nem dizer que o Trump é xenófobo, e embora diga que as politicas europeias são responsáveis pelo racismo e xenofobia, não diz que os defensores e executantes dessas politicas são racistas (diz é que o racismo é uma reação a essa politicas), logo não está a chamar de racistas aos alvos da sua critica.
Debater, debater, debater sempre - Aquela parte do "Será que Augusto Santos Silva está a par da solução governativa socialista, apoiada por comunistas e bloquistas no parlamento, que está em vigor nesta periferia?" poderia, eventualmente, ser considerada "attack, attack, attack" (como a que dizer "mas este não sabe em que governo está?"), mas é um floreado tão retórico que acho que não deve contar (acho que o autor está a dizer "até é estranho alguém escrever um artigo desses, quando até integra uma governo de «frente popular»", não a fazer um ataque pessoal)
Estaremos à altura deste desafio?- não me parece ter nenhum dos pontos, e na parte do "racismo" até vai em sentido contrário: grande parte do post é desvalorizar a importância do racismo nos resultados.
Reviver o passado no Contraditório - "attack, attack, attack" ("grupo de inconscientes", Nem sei bem como qualificar esta gente")
uma atitude - o texto até parece quase todo isento dos tais pontos, mas no fim parece-me que entra a todo o vapor em "attack, attack, attack" ("É uma atitude miserável e cobarde. Ou melhor, uma atitude de um cobarde miserável.")
O tabu - não me parece ter nehum dos pontos
Make Portugal great again? - não me parece ter nenhum dos pontos (a referencia ao "macróbio" é uma coisa lateral que não me parece que conte)
Tal como dantes... - não me parece ter nenhum dos pontos
auf wiedersehen? - não me parece ter nenhum dos pontos
Todos os fascistas são gordos - Por mais irónico que o texto seja, a parte do " Em Portugal, onde Gramsci reina, cultura e esquerda andaram sempre numa partilha de lençóis nada púdica e pouco saudável. Isso conduz a que, por um lado, todo o cantor, escritor ou pintor – basicamente todo o criador – tenha palco para debitar alarvidades e que, por outro lado, uma inspiração quase que artística invada as luminárias da academia, atingindo estas o pleno da sua criatividade nas mais bizarras propostas e declarações" parece-me "attack, attack, attack".
O que falta às escolas - não me parece ter nenhum dos pontos
Em resumo:
No "attack", estão empatados, nos outros pontos, foram efetivamente mais comuns nos blogs de esquerda (embora não presentes na maioria dos posts).
Se nos limitarmos a textos escritos em resposta a outros (ou a entrevistas, que é quase como se fossem textos), temos:
Pouco altera as proporções (neste quadro poderia facilmente incluir-se também "O tabu" e o "just kidding?", que não sendo respostas a textos especificos, são respostas a "o que muita gente anda a dizer"", mas também não mudava grande coisa).
4 comments:
Que trabalhão! Obrigado.
Miguel, por que é que não alarga a análise e submete a uma revista de estudos de comunicação? É um desperdício ter este trabalho escondido no blogue.
Se fosse um trabalho sério, acho que seria conveniente os posts serem avaliados por pessoas quem nem soubessem bem qual o objetivo do trabalho (estilo dois avaliadores, que leriam versões do post sem indicação do autor nem do blogue, e que não soubessem qual o objetivo do trabalho - se soubessem seria fácil, mesmo sem saber os autores, identificar os posts da direita e da esquerda, e avaliá-los parcialmentente - e só se considerar que o post verificava um dos pontos se ambos os avaliadores o identificassem)
Miguel, há algum tempo que leio as revistas da especialidade, e acredite que 90% do que por lá se publica não tem metade do rigor e distanciamento do que fez aqui.
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