Thursday, October 28, 2010

Re: Acumulação de moeda e reservas fraccionárias

Depois do post do MM Acumulação de moeda e reservas fraccionárias escrevi primeiro sobre o significado da procura de moeda e agora vou aprofundar a análise:

Podemos visualizar dois casos extremos:

1. Sistema bancário com Reservas de moeda a 100%

2. Sistema bancário com Reservas de moeda a 0% (situação cada vez mais verdadeira, dado que na prática as reservas são já muito baixas e como se pôde ver nesta crise, quando os bancos ficam sem reservas, os bancos centrais "apoiam" o sistema bancário com a emissão da moeda em falta, ou seja, na prática, o sistema funciona como se nenhuma reserva fosse necessária).

No primeiro, se a quantidade total de moeda física for 100, e a procura de moeda aumentar, o que acontece sob condições de estabilidade quantitativa (caso do ouro em que a quantidade produzida anualmente tem pouco impacto)? A quantidade continua a ser 100. Então, o que significa dizer que a procura de moeda aumenta? Os preços baixam e o poder de compra dos mesmos 100 aumentam e assim, a procura de moeda traduz-se num aumento do poder de compra da mesma quantidade inalterada de 100 relativamente ao nível geral de preços.

No segundo caso, o que se passa ou deixa de passar depende se o Banco emite mais moeda e/ou crédito ou não. A teoria vigente é que os bancos centrais devem aumentar a oferta quantitativa de moeda no sentido de responder à procura de moeda de forma a que os preços permaneçam estáveis (isto é, sem inflação nos preços do consumidor), fruto da deflaçãofobia.

Mas ao usarem o índice de preços no consumidor como medida, resulta em ignorar o que se passa com os preços de activos e de bens de capital; além disso reina uma confusão entre procura de moeda e a procura de crédito.

O aumento da procura de moeda a dar-se (normalmente por aumento da incerteza) em substância é a procura do aumento do poder de compra detido em moeda relativamente ao nível geral de preços (não um aumento da quantidade de moeda por si mesmo) e assim, na medida em que os preços baixam esse aumento da procura de moeda é satisfeito. O que equilibra a procura de moeda é o nível geral de preços.

A segunda, em substância, é a procura de poupança anterior (capital) necessária para suportar os investimentos enquanto estes são deficitários (curiosamente, este défice no limite é constituído precisamente pelo conjunto de salários a pagar antes da obtenção de receitas - o capital é assim uma expressão de salários a pagar por antecipação de receitas em relação às quais nem são certas e frequentemente não são suficientes levando a perdas, a mão de obra é a primeira beneficiária do capital ao contrário do que é intuído). O que equilibra a procura de crédito com a poupança prévia é a taxa de juro.

Mas voltando à questão inicial: podemos visualizar esse caso extremo (que como vimos é até muito parecido com o actual sistema monetário) se pensarmos na existência de um único Banco e numa única moeda.

Numa armadilha de liquidez, as pessoas procuram moeda e assim a poupança traduz-se numa alternativa quer à poupança como investimento quer ao consumo. Esse é o pesadelo Keynesiano (que é interpretado mais como uma causa do que como uma consequência). Isto faz sentido num sistema em que a moeda física (como o ouro) pode existir com expressão fora do sistema bancário. O argumento evocado é que desta forma quer o consumo quer o investimento caiem (mas a resposta austríaca é que em si mesmo a procura de moeda não constitui um problema estrutural, o consumo e investimento real ceteris paribus não tem de alterar-se se a única alteração é o aumento da procura de moeda).

Mas num sistema monetário de reservas parciais (em especial se forem zero) toda a moeda é ao mesmo tempo crédito, ou seja, na própria lógica do edifício que suporta o actual sistema, onde a moeda não deve "estar parada" (razão pelo qual vários economistas com fobia de tal coisa, tenham proposto formas de acabar totalmente com as moedas e notas, forçando que toda a moeda esteja nos bancos em depósitos à ordem...e um dia creio que a isso vão chegar...coisas da vontade geral) a "moeda" é sempre crédito, por isso, no seu próprio edifício onde a causa das crises é essa procura de moeda ou armadilha de liquidez, algo não bate certo.

E para bater certo vão ter de socorrer-se da teoria que pretendem ignorar, porque é a própria expansão de crédito permitido pelas reservas parciais (sistema que a doutrina económica vigente suporta para não haver "dinheiro parado", porque isso é tirar crédito à economia) que leva a que uma bolha se forme e que quando rebenta põe em causa a solvabilidade e liquidez dos bancos com reservas parciais o que induz a uma procura de moeda, que hoje em dia, se traduz por pedidos de transferências pelos clientes de um banco considerado perto de falir para outros bancos que por alguma razão consideram mais seguros, ao mesmo tempo claro, que a economia tem de andar para trás para liquidar investimentos e negócios sem sustentação. Como os bancos centrais e o regime político têm pânico de falências bancárias, com toda a certeza irão sempre inflacionar o sistema para responder à falta de reservas/moeda necessários para os bancos poderem responder a pedidos de transferência, chamando a isto "armadilha de liquidez".

4 comments:

Miguel Madeira said...

"Mas num sistema monetário de reservas parciais (em especial se forem zero) toda a moeda é ao mesmo tempo crédito,"

Mas a minha tese é que não é "em especial se forem zero", é mesmo só e apenas se forem zero (basta a as reservas serem de 0,5% para um aumento da procura de moeda ter exactamento o mesmo efeito que se forem de 100%).

Miguel Madeira said...

Podemos regressar à formula que calculei no outro post:

produção*preços = [moeda em circulação]*[velocidade de circualção da moeda]/[racio de reservas]

Seja qual for o rácio de reservas, uma variação na "velocidade de circulação" (ou seja, na procura de moeda) tem sempre o mesmo efeito no produto nominal (produção*preços).

A única exepção é mesmo quando o rácio é zero (em que a formula resulta numa indeterminação).

CN said...

E verdade se o coeficiente de reservas tiver aproveitado ao seu máximo:

Total de depósitos = reservas/ coeficiente de reservas

Sendo assim, os Bancos não conseguem não conseguem de igual forma expandir mais os depósitos, ou seja, emitir moeda por emissão de novos depósitos.

Assim, a quantidade de moeda é fixa...desde que:

Os Bancos Centrais não emitam mais moeda (crédito aos bancos, compra de Dívida Pública e outros) ou não baixem o coeficiente de moeda (e esta é a razão porque sucessivamente com o tempo forma baixando esse coeficiente).

Voltando à questão: a conversa entre o austríaco e o Keynesiano é que o austríaco tem razão ao perguntar ao Keynesiano que se a moeda agora é crédito, porque é que o aumento da procura de moeda diminui o crédito? Esta pergunta tem sentido dentro da lógica falaciosa Keynesiana.

Na verdade, o sistema funciona com coeficiente zero, porque os bancos expandem os depósitos e quanto é necessário o banco central injecta mais reservas ou vice-versa, existindo confusão entre moeda adicional para suportar as trocas e moeda adicional para dar crédito adicional. O sistema é disfuncional por natureza.

A tese de algumas teorias populares que circulam via Zeitgeist e "Debt is money" é que reconhecem o problema das reservas parciais e criação de moeda para crédito e assim propõem o actual sistema estatista mas onde as reservas são 100% e toda a injecção de nova moeda ser daria via despesa pública directa.

Tem alguma razão de ser, porque esta emissão de moeda para pagar despesa do Estado é altamente inflacionaria (ao contrário da emissão para crédito) e assim, é mais fácil de ver os seus efeitos concretos. Mas não o defendo, essa poder para despesa pública resultou sempre por exemplo no poder de evocar emergências (como guerra) para cobrar um imposto via inflação rápida.

De notar que o termo velocidade não tem existência por si próprio, esse termo só se determina pela própria equação, isto é:

velocidade = (total transacções num período de tempo / quantidade de moeda)

Mas mesmo num padrão ouro com 100% de reservas podemos saber o que é quantidade total de moeda?

Devemos contar com o ouro em jóias? O ouro "parado" é moda? As reservas conhecidas nas minas será ouro parado? E se as pessoas começarem a usar parcialmente prata? DE repente termos de contar com todo stock de prata como quantidade de moeda?

o que estou aqui é interrogar-me sobre essas medidas. E hoje é difícil obter uma definição de moeda.

CN said...

Vou ter que postar este comentário refeito que saiu à pressa :)