Pelos vistos, hoje é o "Dia da Libertação dos Impostos"[pdf], ou seja (usando os termos da TVI), "O primeiro dia do ano em que os portugueses já cumpriram as obrigações fiscais é esta quinta-feira e por isso os portugueses começam agora a trabalhar para as próprias carteiras. Os trabalhadores gastaram 137 dias ou seja, um terço do ano, só para pagar os impostos no ano passado".
Na verdade, o DLI é, parcialmente, uma mistificação: imagine-se duas pessoas, o Fernando, ganhando 1.000 euros/mês e pagando 20% de impostos e o Mario, ganhando 500 euros/mês e pagando 10% de impostos. Assim, o Fernando trabalha 73 dias por ano para pagar os impostos (365*20%) e o Mario 36,5 dias, ou seja, em média trabalham 55 dias por ano para pagar impostos.
Agora, vamos aplicar a metodologia do "DLI": pegamos nos impostos totais (3.000=200*12+50*12), divide-se pelo rendimento total (18.000=1.000*12+500*12) e multiplica-se por 365 dias e temos o resultado de 60 dias.
Ou seja, com um sistema fiscal progressivo os contribuintes, em média, trabalham menos dias "para o Estado" do que o valor calculado para o DLI.
Também podemos fazer o raciocinio inverso: imagine-se um sistema fiscal em que todos os contribuintes pagassem o mesmo, à maneira da malograda "poll tax" de Tatcher (um caso extremo de regressividade) - assim, se tanto o Fernando como o Mario pagassem 125 euros/mês de imposto, o Fernando iria trabalhar 46 dias para impostos e o Mario 91 dias, ou seja, em média trabalhariam 68 dias (mas o cálculo do DLI continuaria a indicar 60 dias). Assim, com um sistema regressivo os contribuintes trabalham mais dias "para o Estado".
Claro que o DLI pode ter alguma utilidade para ilustrar as diferenças de carga fiscal entre paises (ou entre anos), mas o discurso associado ("os portugueses trabalharam 137 dias para pagar impostos") é um bocado demagógico (OK, admito que no meu blog também deve haver muita coisa demagógica...), ainda mais quando muitos dos propagandistas do DLI são também entusiastas da "flat tax", que (ao reduzir a progressividade fiscal) até poderia aumentar o número de dias que realmente trabalhamos para pagar impostos.
Ainda acerca do DLI (no contexto dos EUA):
Still taxing the truth: the Tax Foundation and the "Tax Freedom Day"
Na verdade, o DLI é, parcialmente, uma mistificação: imagine-se duas pessoas, o Fernando, ganhando 1.000 euros/mês e pagando 20% de impostos e o Mario, ganhando 500 euros/mês e pagando 10% de impostos. Assim, o Fernando trabalha 73 dias por ano para pagar os impostos (365*20%) e o Mario 36,5 dias, ou seja, em média trabalham 55 dias por ano para pagar impostos.
Agora, vamos aplicar a metodologia do "DLI": pegamos nos impostos totais (3.000=200*12+50*12), divide-se pelo rendimento total (18.000=1.000*12+500*12) e multiplica-se por 365 dias e temos o resultado de 60 dias.
Ou seja, com um sistema fiscal progressivo os contribuintes, em média, trabalham menos dias "para o Estado" do que o valor calculado para o DLI.
Também podemos fazer o raciocinio inverso: imagine-se um sistema fiscal em que todos os contribuintes pagassem o mesmo, à maneira da malograda "poll tax" de Tatcher (um caso extremo de regressividade) - assim, se tanto o Fernando como o Mario pagassem 125 euros/mês de imposto, o Fernando iria trabalhar 46 dias para impostos e o Mario 91 dias, ou seja, em média trabalhariam 68 dias (mas o cálculo do DLI continuaria a indicar 60 dias). Assim, com um sistema regressivo os contribuintes trabalham mais dias "para o Estado".
Claro que o DLI pode ter alguma utilidade para ilustrar as diferenças de carga fiscal entre paises (ou entre anos), mas o discurso associado ("os portugueses trabalharam 137 dias para pagar impostos") é um bocado demagógico (OK, admito que no meu blog também deve haver muita coisa demagógica...), ainda mais quando muitos dos propagandistas do DLI são também entusiastas da "flat tax", que (ao reduzir a progressividade fiscal) até poderia aumentar o número de dias que realmente trabalhamos para pagar impostos.
Ainda acerca do DLI (no contexto dos EUA):
Still taxing the truth: the Tax Foundation and the "Tax Freedom Day"
9 comments:
Caro M.M
As minhs desculpas.
O caro amigo deixou um "recado" num post do infernosind acerca de prostituição e eu não vi,logo não comentei...
é claroque isto é off topic em relação ao post em questão.(este)
que ,por acaso vou linkar uma vez que está relacioando com um que eu pus hoje.
como sempre conseguiu ver o outro lado da questão.
é a primeira vez que ouço falar de tal dia.
Falta-te um zero na 2ªigualdade, é
18000 = 1000*12+500*12
Não percebo de onde vêm os 3000 da 1ª igualdade? Os impostos globais o que são?
O DLI não é mais do que areia neo-liberal atirada aos olhos dos cidadãos, também designada por "framing". A intenção é clara: fazer com que inconscientemente as pessoas passem a considerar nos impostos logo à partida como algo de mau, desnecessário, e que portanto deve ser diminuído.
Quem quiser saber mais sobre "framing" leia os livros do Lakoff, ou então uma das múltiplas entrevistas dele disponíveis online, como esta:
http://www.berkeley.edu/news/media/releases/2003/10/27_lakoff.shtml
Directamente relacionado como o DLI, leiam o que ele diz sobre o uso nos EUA do termo "tax relief".
"Falta-te um zero na 2ªigualdade"
Tens razão.
"Não percebo de onde vêm os 3000 da 1ª igualdade? Os impostos globais o que são?"
O Fernando paga 20% de 1000 euros/mês (200 euros/mês); o Mario 10% de 500 euros/mês (50 euros/mês). Multiplicado por 12 meses, o total de impostos cobrados nesta economia é de 3.000 euros [12*(200+50)]
os suecos pagam muito de impostos, acho que ninguem aqui se importava de viver numa suecia iberica.
eu não me importava.
Mas não se trata só de impostos sobre o trabalho. Os impostos mais lucrativos para o Estado, aliás, são os indirectos que se aplicam em igual medida a todos, dependendo do que consumimos, claro (quem fuma paga MUITO MAIS impostos do que quem não fuma).
"Mas não se trata só de impostos sobre o trabalho. Os impostos mais lucrativos para o Estado, aliás, são os indirectos que se aplicam em igual medida a todos"
Pois, mas como o nosso sistema fiscal é uma combinação de impostos progressivos e regulares (os únicos impostos que são capazes de ser regressivos serão selo do carro, e talvez o tabaco e o ISP), quer dizer que, na sua globalidade, o sistema fiscal é progressivo, logo mantém-se o meu argumento que, em média, os contribuintes pagam menos "dias" do que o calculado pelo DLI.
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