Sunday, May 28, 2006

O Estado Novo foi fascista?

No Causa Nossa, Insurgente, Insustentável Leveza, armadilhaparaursosconformistas, Torre de Ramires, etc., discute-se se o Estado Novo foi um regime fascista.

Eu acho que não foi, e o comentário da cãorafeiro ao post da Sabine, ao falar das semelhanças entre o salazarismo e o fascismo, acaba por referir o que, para mim, é a diferença fundamental: "há também uma grande diferença na forma como os dois regimes procuravam a legitimação: MUSSOLINI APELAVA A MOBILIZAÇÃO (...) SALAZAR APOSTAVA NA ABSTENÇÃO, NO OPOSTO À MOBILIZAÇÃO". Enquanto o fascismo italiano (e o nazismo alemão) se apoiavam num movimento de massas, o salazarismo apoiava-se, simplesmente, na força do aparelho de estado. A União Nacional e a Legião Portuguesa eram pálidas imitações do Partido Fascista italiano (ou do Partido Nacional-Socialista alemão) e dos "camisas negras" (ou dos "camisas castanhas" alemães). A base de recrutamento do pessoal governante era a Universidade e o Exército, não a U.N. Quanto à Legião, o que ouvi dizer é que era aonde os "espreita-marés" se inscreviam para ganhar respeitabilidade.

O Estado Novo tem a sua origem num golpe militar, não num partido armado. "Fascista" seria, por exemplo, o Movimento Nacional Sindicalista. Finalmente, se aqui se diz que o Estado Novo não era fascista, quem somos nós para contrariar?

Mas, será que isto é muito relevante? Eu acho que não (ou melhor, é, mas noutro contexto) - para os oposicionistas, serem presos e torturados pela policia não é substancialmente diferente de serem presos e torturados por uma mílicia de camisas-coloridas. Também é mais ou menos indiferente se os adjuntos do ditador são "notáveis" tradicionais (catedráticos e generais) ou quadros partidários.

A diferenças entre fascistas e conservadores autoritários "à moda antiga" é mais relevante antes de chegarem ao poder (uns organizam manifestações e usam uniformes, enquanto os outros conspiram em restaurantes selectos). Depois de chegarem ao poder, as diferenças tenderão a esbater-se (sobretudo se os "conservadores à moda antiga" forem também nacionalistas): uma ditadura clássica, se tiver ambições de continuidade, tenderá a organizar os seus apoiantes (criando, assim, uma espécie de "partido do governo"); por seu lado, depois de um movimento fascista chegar ao poder, muita gente irá entrar para o partido ou para a milicia apenas para fazer carreira, diminuindo o seu vigor ideológico e tornando-os como um mero prolongamento do aparelho de Estado.

4 comments:

Anonymous said...

então nao foi fascista?

os valores eram os mesmos, a unica diferença foi o meio e o metodo.

chamem-lhes conservadores nacionalistas, chamem-hes o que quiserem...

eu continuo na minha; nem deus, nem patria, nem amo.

Anonymous said...

«A diferenças entre fascistas e conservadores autoritários "à moda antiga" é mais relevante antes de chegarem ao poder »

Acho que podemos perguntar, não totalmente no gozo, se Mussulini, depois de tomar o poder, era fascista ou se se aburguesou, deitando fora a ideologia pelo poder.

Miguel Madeira said...

"podemos perguntar... se Mussulini, depois de tomar o poder, era fascista ou se se aburguesou, deitando fora a ideologia pelo poder."

Como creio que os fascistas defendiam que a acção é mais importante que a teoria, se calhar podem fazer "mudanças de rumo" sem estarem a deitar fora a ideologia.

Há uma frase reveladora de Mussolini: "podemos dar-nos ao luxo de sermos revolucionários e reacionários, aristocratas e democratas, proletários e anti-proletários"

""#$ said...

Caro M.madeira.
agradecido pela ligação.