André Abrantes Amaral escreve, no atlântico, que "A descentralização (...) [i]mplica que se crie uma nova relação directa entre os cidadãos e os governantes. Ora, tal só se faz responsabilizando eleitores e eleitos, o que só se consegue quando há dinheiro envolvido. Por outras palavras, quando há impostos."
Imagine-se um jovem (de Portimão, p.ex.) que vai estudar para Lisboa. Pode-se sustentar de três maneiras:
a) pode arranjar um emprego, e viver do seu ordenado
b) os pais podem lhe dar um cartão multibanco da conta deles
c) os pais podem pagar-lhe uma mesada mensal
[haverá com certeza muitas mais maneiras possíveis, mas estas serão as mais típicas]
No caso a), o jovem em questão terá todo o interesse em gerir bem o seu dinheiro; afinal, como se diz, "sai-lhe do pêlo".
No caso b), se não tiver escrúpulos morais, terá todo o interesse em gastar o mais dinheiro possível da conta dos pais (tendo como único limite ter cuidado para estes não chegarem à conclusão que o melhor é tirar-lhe o cartão)
Agora, vamos ao caso c). A mim, parece-me que, aí, o jovem em questão tem exactamente os mesmos incentivos que no caso a) em gerir o dinheiro de forma criteriosa - afinal, tendo uma mesada fixa, qualquer dinheiro que ele gaste mal gasto significa menos dinheiro para gastar noutras coisas.
Regressando à regionalização: A.A.Amaral parece pensar como se apenas existissem as opções "cartão multibanco" (as regiões receberem verbas discricionárias do Orçamento de Estado) e "arranjar um emprego" (as regiões serem financiadas por impostos regionais), ignorando a opção "mesada fixa" (as regiões serem financiadas pelo Orçamento de Estado de acordo com um regra objectiva definida em lei, em função da população, área, etc.).
A mim, parece-me que, se as regiões forem financiadas pelo OE, de acordo com uma regra objectiva, não há incentivo ao despesismo: se o governo regional gasta dinheiro mal gasto nalguma actividade, significa que haverá menos dinheiro para outras actividades, o que em principio irá ser penalizado pelos eleitores.
Na verdade, se não existirem transferências legais de dinheiro para as regiões adminstrativas, a tendência ao despesismo poderá ser ainda mais, pelo menos nas regiões mais pobres. Porque digo isto?
O financiamento das regiões tem três possiveis fontes:
a) impostos regionais e afins
b) transferencias discricionários do Orçamento do Estado
c) transferencias do Orçamento de Estado fixas por lei
Tal como no caso do estudante, parece-me que é no caso b) que há maior incentivo ao despesismo; ora, se não existirem transferencias estabelecidas por lei, as transferencias discricionárias representarão um grande peso no orçamento das regiões mais pobres (já que, em principio, recembem pouco de impostos) e aí é que haverá um grande incentivo para elegar politicos que tenham como principal mérito saberem "sacar" dinheiro a Lisboa.
AAAmaral pode argumentar que é tanto contra as transferencias discricionárias como contra as transferencias legais, mas a questão é que, mesmo que ele se pinte de azul, não consegue acabar com as transferencias discricionárias, já que estas resultam de decisões caso a caso que são praticamente impossiveis de impedir, mesmo com um regra "o governo central não pode transferir verbas para as regiões" (p.ex., se o governo não pode dar dinheiro a uma região para esta fazer uma dada obra, faz o próprio governo a obra, argumentando que é de interesse nacional; ou então paga "compensações" a uma região por esta ter aceite um aterro sanitário; o limite é a imaginação).
Aliás, AAAmaral acaba o seu artigo escrevendo que "O problema é que quem (...) defende [a regionalização] não parece interessado em criar algo mais que uma delegação do estado central. De criar muitas Lisboas e espalhar Terreiros do Paço por esse país fora." Ora, o essencial das despesas de Lisboa/Terreiro do Paço são cobertas por impostos cobrados por iniciativa de Lisboa, não por transferencias da UE ou da ONU, logo o problema não estará aí.
Já agora, mudando um bocadinho (mas não muito) de assunto - há algum estudo que indique os municipios são mais despesistas que a Administração central (reconheço que isso talvez seja dificil de medir)?
Imagine-se um jovem (de Portimão, p.ex.) que vai estudar para Lisboa. Pode-se sustentar de três maneiras:
a) pode arranjar um emprego, e viver do seu ordenado
b) os pais podem lhe dar um cartão multibanco da conta deles
c) os pais podem pagar-lhe uma mesada mensal
[haverá com certeza muitas mais maneiras possíveis, mas estas serão as mais típicas]
No caso a), o jovem em questão terá todo o interesse em gerir bem o seu dinheiro; afinal, como se diz, "sai-lhe do pêlo".
No caso b), se não tiver escrúpulos morais, terá todo o interesse em gastar o mais dinheiro possível da conta dos pais (tendo como único limite ter cuidado para estes não chegarem à conclusão que o melhor é tirar-lhe o cartão)
Agora, vamos ao caso c). A mim, parece-me que, aí, o jovem em questão tem exactamente os mesmos incentivos que no caso a) em gerir o dinheiro de forma criteriosa - afinal, tendo uma mesada fixa, qualquer dinheiro que ele gaste mal gasto significa menos dinheiro para gastar noutras coisas.
Regressando à regionalização: A.A.Amaral parece pensar como se apenas existissem as opções "cartão multibanco" (as regiões receberem verbas discricionárias do Orçamento de Estado) e "arranjar um emprego" (as regiões serem financiadas por impostos regionais), ignorando a opção "mesada fixa" (as regiões serem financiadas pelo Orçamento de Estado de acordo com um regra objectiva definida em lei, em função da população, área, etc.).
A mim, parece-me que, se as regiões forem financiadas pelo OE, de acordo com uma regra objectiva, não há incentivo ao despesismo: se o governo regional gasta dinheiro mal gasto nalguma actividade, significa que haverá menos dinheiro para outras actividades, o que em principio irá ser penalizado pelos eleitores.
Na verdade, se não existirem transferências legais de dinheiro para as regiões adminstrativas, a tendência ao despesismo poderá ser ainda mais, pelo menos nas regiões mais pobres. Porque digo isto?
O financiamento das regiões tem três possiveis fontes:
a) impostos regionais e afins
b) transferencias discricionários do Orçamento do Estado
c) transferencias do Orçamento de Estado fixas por lei
Tal como no caso do estudante, parece-me que é no caso b) que há maior incentivo ao despesismo; ora, se não existirem transferencias estabelecidas por lei, as transferencias discricionárias representarão um grande peso no orçamento das regiões mais pobres (já que, em principio, recembem pouco de impostos) e aí é que haverá um grande incentivo para elegar politicos que tenham como principal mérito saberem "sacar" dinheiro a Lisboa.
AAAmaral pode argumentar que é tanto contra as transferencias discricionárias como contra as transferencias legais, mas a questão é que, mesmo que ele se pinte de azul, não consegue acabar com as transferencias discricionárias, já que estas resultam de decisões caso a caso que são praticamente impossiveis de impedir, mesmo com um regra "o governo central não pode transferir verbas para as regiões" (p.ex., se o governo não pode dar dinheiro a uma região para esta fazer uma dada obra, faz o próprio governo a obra, argumentando que é de interesse nacional; ou então paga "compensações" a uma região por esta ter aceite um aterro sanitário; o limite é a imaginação).
Aliás, AAAmaral acaba o seu artigo escrevendo que "O problema é que quem (...) defende [a regionalização] não parece interessado em criar algo mais que uma delegação do estado central. De criar muitas Lisboas e espalhar Terreiros do Paço por esse país fora." Ora, o essencial das despesas de Lisboa/Terreiro do Paço são cobertas por impostos cobrados por iniciativa de Lisboa, não por transferencias da UE ou da ONU, logo o problema não estará aí.
Já agora, mudando um bocadinho (mas não muito) de assunto - há algum estudo que indique os municipios são mais despesistas que a Administração central (reconheço que isso talvez seja dificil de medir)?
3 comments:
Discordo. Primeiro teria-se de comparar com uma mesada para toda a vida. A mesada mensal ao não ser elástica impossibilita os cortes de despesa.
O seu erro é que parte do princípio que há sempre necessidade de gastar o mesmo dinheiro, quando a realidade da região muda de ano para ano.
"se o governo regional gasta dinheiro mal gasto nalguma actividade, significa que haverá menos dinheiro para outras actividades, o que em principio irá ser penalizado pelos eleitores."
Não acontecerá porque o dinheiro não volta para o bolso dos contribuintes. As pessoas não têm tempo para escrutinar algo que não lhes trás benefícios directos.
Opps faltou isto: lucklucky
Creio que antes de discutir o financiamento questão está mais a montante. Quais as funções que as regiões deveriam desempenhar?
a discutir falta a opção d. que seria
viver da bolsa de estudo e do financiamento familiar e de trabalhos
na economia subterrânea. Que é o risco das transferências do OGE.
Tenho a impressão que mesmo que se regionalizasse como querem os seus maiores defensores, não se eliminariam os problemas. Uma vez que o problema principal estará na forma como as instituições/organizações funcionam
e a forma como os poderes estão distribuídos entre elas é apenas secundário.
Sendo que os municípios fazem coisas a menos em algumas áreas e a mais noutras. A regionalização costuma ser uma opção de países maiores. No limite posso dar-lhe um exemplo na Dinamarca, com um Estado
Social que funciona, mais de 60% da despesa pública é municipal.
Sinceramente não me parece que a regionalização venha também resolver as inúmeras disfunções nas nossas autarquias que neste momento não estão preparadas na sua maioria para assumir maiores responsabilidades.
pública
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