[Respondendo ao Rui Botelho Rodrigues e ao Carlos Novais]
"Primeiro, esse computador, não sendo seu, é certamente de alguém. Esse alguém certamente lhe cedeu (de uma forma ou outra) o seu uso, e logo – tal como uma pessoa que arrenda uma casa – o Miguel tem controlo exclusivo sobre o recurso no decorrer da argumentação. Mas mais importante: não será seu o corpo que usa para argumentar? Não será necessário que o Miguel tenha controlo sobre o próprio corpo para produzir um argumento?."
"Defender esta norma por argumentação exige que quem argumenta exerça controlo total, não-momentâneo, sobre o seu corpo, já que a sua existência depende da não-apropriação por parte de outros do corpo que argumenta quando não está a argumentar" (RBR)
Mas mantém-se que Argumentar com o seu próprio corpo implica controlo absoluto sobre o seu corpo senão não existe Argumento (CN)Não necessito de ter controlo total e/ou permanente do meu corpo para poder argumentar (e repito que o próprio facto de nós estarmos aqui a argumentar prova isso).
Primeiro, esse computador, não sendo seu, é certamente de alguém. Esse alguém certamente lhe cedeu (de uma forma ou outra) o seu uso, e logo – tal como uma pessoa que arrenda uma casa – o Miguel tem controlo exclusivo sobre o recurso no decorrer da argumentação.Mas não tenho poder absoluto e permanente sobre esse computador (tal como um escravo cujo dono lhe diga "Desde que cumpras a tua quota de produção e não te danifiques, podes fazer o que quiseres nas tuas horas vagas" não tem controlo absoluto sob o seu corpo).
Esse é o que chamo argumento da constatação da força. Por esse argumento poderíamos dizer que os escravos não tinham direitos naturais porque se constata que já existiam proprietários e não têm a força ou capacidade para o contrariar. (CN)Bem, se o argumento contra a escravatura fosse "a escravatura vai contra a lei natural porque alguém não consegue fazer determinada coisa se for escravo", o facto que, no mundo real, os escravos podem fazer isso deitaria abaixo o argumento.
O que eu me parece é que na "ética argumentativa" há uma certa confusão entre os conceitos de propriedade e de posse.
Se o argumento é que para argumentar eu preciso de deter a posse, isto é, o controlo físico, do meu corpo, isso é verdade, mas não é lá muito relevante: afinal, penso que nenhuma ideologia à face da terra pretende abolir o conceito de posse (imagino que até na Coreia do Norte as pessoas tenham as "suas" casas, os "seus" instrumentos de trabalhos, etc., mesmo que não sejam os seus proprietários).
Mas se o argumento for de que para argumentar é necessário ter a propriedade do próprio corpo (isto é, o direito absoluto, permanente, irrevogável e eventualmente transferível de decidir o que fazer - ou o que não fazer - com esse corpo), penso que a simples observação do mundo real demonstra que isso não é necessário para a argumentação.
A menos que enfraqueçamos um pouco a definição de "propriedade", no sentido de considerarmos qualquer direito especifico de um individuo sobre um dado bem como uma forma de "propriedade" (p.ex., um inquilino - privado ou de um bairro social - terá uma espécie de propriedade sobre a "sua" casa), mesmo que limitada ou transitória; mas, se for assim, então qualquer sistema socio-económico respeita a "propriedade" (de novo, imagino que na Coreia do Norte as pessoas tenham a "sua" casa, ou pelo menos o "seu" quarto), logo isso deixa de servir como um argumento a favor do anarco-capitalismo (já que, de acordo com essa definição alargada de propriedade, quase todas as sociedades existentes reconhecem a propriedade, com maiores ou menores limitações).
Pondo a coisa de outra maneira - a tese que "Para poder argumentar eu preciso de ter a [X] do meu corpo, e o respeito pela [X] implica o anarco-capitalismo como o sistema mais de acordo com o direito natural" só faz sentido se o significado de "X" mudar a meio da frase (uma variante do que alguém - suponho que um ancap - chamou a "falácia da sandes de fiambre") - se "X" significar algo como "controlo absoluto e permanente", a primeira parte é falsa; se "X" significar apenas "algum controlo, mesmo que temporário e/ou sujeito a limites por um poder superior, incluindo a revogação", então a segunda parte será falsa.
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