Wednesday, March 22, 2006

O CPE será bom para os jovens?

O principal argumento dos defensores do "contrato de primeiro emprego" que o governo francês tenta implementar é de que vai combater o desemprego dos jovens, já que os empregadores, sabendo que, se quiserem, podem despedi-los nos 2 anos seguintes, vão se sentir mais confiantes para contratarem jovens com menos de 26 anos (há alguns posts no Insurgente que explicam bem este raciocinio).

Eu até nem discordo desse ponto - realmente, o CPE tornará mais fácil um jovem arranjar emprego. Mas também tornará mais díficil um jovem arranjar um emprego "definitivo" (com "definitivo" não me refiro a um mítico "emprego para toda a vida", mas a um emprego que só possa terminar com "justa causa"). Imaginemos que, actualmente, haverá 60% de jovens com empregos "definitivos", 10% com empregos "precários" e 30% desempregados (estes números são imaginários - só os 30% de desempregados é que é real - mas isso não afecta o raciocinio). Mesmo na hipotese super-optimista de o CPE reduzir o desemprego juvenil a 0%, isso não implicaria necessariamente uma melhoria: na situação actual, um jovem teria 70% de hipoteses de arranjar emprego e 60% de hipoteses de arranjar um emprego definitivo; com o CPE, passaria a ter 100% de hipoteses de arranjar emprego, mas 0% de hipoteses de arranjar emprego "definitivo" - quem é que nos garante que um jovem francês não preferirá ter mais dificuldade em arranjar emprego, em troca de maior segurança quando finalmente o alcançar? Na verdade, a reacção que se está a ver parece indicar que preferem (embora é verdade que, só por si, manifestações podem não ser representativas - mas as sondagens também indicam grande oposição ao CPE).

Além disso, a única coisa que podemos saber é que o CPE vai reduzir o desemprego - mas não sabemos em quanto o vai reduzir (pelo menos não vi referências a nenhum estudo fazendo projecções quantitativas): se o desemprego se reduzir de 30% para 29%, dificilmente compensará os sacrificios em segurança no emprego.

Assim, não podemos dizer que o CPE é benéfico para os jovens, e por duas razões:

Em primeiro lugar, não sabemos exactamente (de forma quantificável) qual o beneficio que vai trazer (embora admito que possam ser feitos estudos nesse sentido).

E, mais importante, mesmo que saibamos (ou tenhamos um ideia aproximada) de quais são esses beneficios, não sabemos se os jovens franceses (ou a maioria deles) preferirão o "beneficio" de mais facilidade em obter emprego face ao "sacrificio" de menos estabilidade. Eles parecem estar maioritariamente a dizer que "não".

Claro que há outros argumentos (tanto filosóficos como pragmáticos) que podem ser aduzidos em defesa do CPE - o único argumento que este post pretende refutar é mesmo o de que "é melhor para os interesses dos jovens".

3 comments:

Anonymous said...

penso que há mais argumentos filosoficos contra o cpe do que a favor.

de resto, penso que essa medida não vai ter grandes resultados, apenas desestabilizar a vida das pessoas que começam a trabalhar.
ainda estou para ver quando esta medida é alargada para alem dos primeiros dois anos de trabalho. tudo em nome do "emprego".

trabalho com dignidade e segurança? utopias... e assim se vê os direitos a serem destruidos a pouco e pouco.

Miguel Madeira said...

"ainda estou para ver quando esta medida é alargada para alem dos primeiros dois anos de trabalho"

Os passos seguintes são fáceis de imaginar - primeiro, quando os trabalhadores se aproximarem dos 25 anos e 11 meses são despedidos e substituidos por trabalhadores mais novos (tal como hoje em dia os contratados a prazo são despedidos - ou não renovados - ao fim de quatro contratos). Depois, como haverá mais trabalhadores de 25 anos a ser contratados do que de 26, isso vai ser apresentado como a prova de que o CPE "funciona" e ser usado como argumento para o generalizar.

Anonymous said...

tanta luta e tanto sangue contra os que agora o estado protege, para nada.