Saturday, May 12, 2007

Questão para os "austriacos"

Tenho aqui uma questão para "o outro lado da barricada" - os adeptos da "Escola Económica Austríaca" (p.ex., Insurgente, Causa Liberal, Arte da fuga, Ação Humana, penso que o Blasfémias, etc.).

Para começar, não sei se já percebi bem o que é isso, logo se calhar vou dizer alguns disparates.

Ao que me parece, entre outras coisas, vocês rejeitam o modelo neo-clássico, em que as empresas não têm lucro, e vêem a economia como um sistema em que há os empreendedores, que descobrem oportunidades de negócio lucrativas; vendo que esse negócio dá dinheiro, mais empreendedores entram nele, fazendo baixar os preços (ou subir os preços das matérias-primas utilizadas), até que os lucros desse negócio acabam por tender para zero (caracterizei bem a vossa posição?).

Agora, imagine-se que há um empreendedor que tem uma "pancada" qualquer que o leva, perante uma oportunidade de negócio, em vez de aproveitar para ter lucro, aproveitar para vender mais barato aos clientes e/ou comprar mais caro aos fornecedores, tendo logo o tal lucro zero.

A minha questão - acham que a actividade de "empreendedores" (que até podem nem ser indivíduos - pode ser uma associação, p.ex.) desse género é:

a) má para a economia
b) boa para a economia
c) nem boa nem má

Agora, apresento um argumento no sentido de que essa actuação é boa - os fornecedores ficam a ganhar, os clientes ficam a ganhar e o referido "empreendedor" não fica a perder (afinal, se ele prefere isso a ter lucro, quer dizer que, na sua análise, fica a ganhar com isso). E, em termos de beneficio geral, até é melhor do que um "empreendedor" que tenha lucro e depois dê-o para caridade, já que o beneficio para os consumidores de ele vender a "preço de custo" é maior que o lucro que ele obteria se vendesse a um preço mais alto (já que os consumidores poupam o que ele deixa de ganhar e há ainda o beneficio adicional para os consumidores que não comprariam se o preço fosse mais alto) - o mesmo raciocínio, claro, aplicasse se a linha de acção for comprar mais alto aos produtores em vez de vender mais barato aos consumidores.

7 comments:

Pedro said...

"[...]vêem a economia como um sistema em que há os empreendedores, que descobrem oportunidades de negócio lucrativas; vendo que esse negócio dá dinheiro, mais empreendedores entram nele, fazendo baixar os preços (ou subir os preços das matérias-primas utilizadas), até que os lucros desse negócio acabam por tender para zero (caracterizei bem a vossa posição?)."

Eu não sou austríaco nem neoclássico e, além do mais, sou um zero à esquerda em economia. Porém, pareceu-me ver nesta passagem acima algo que na prática dificilmente pode suceder, na minha modesta opinião. Quando surge a concorrência entre empreendedores de modo a baixar preços, não demora muito tempo a surgirem as habituais fusões e anexações (vulgo Opas, e outro termos que me escapam) que por vezes dão origem a monopólios o que causa a estabilização temporária de preços, e/ou a diminuição da sua baixa.
Claro que os monopólios não são eternos e depois há fugas e mais concorrência, mas entretanto isso dá tempo de a inflação cumprir o seu papel. Logo a ideia de lucro zero creio não ser muito possível.

jcd said...

Apenas para notar que o conceito de lucro zero não é contabilístico. O lucro zero já inclui a remuneração do capital.

Anonymous said...

Miguel, bom texto, interessante.
Ainda hoje farei alguns comentários sobre ele.
Abraços, Guilherme

AA said...

Caro Miguel,

Eu não sou economista nem "austríaco", portanto não posso falar com autoridade ou conhecimento científico muito correcto...

...mas essa questão simplesmente não se põe, porque não se faz juízos de valor sobre o empreendedorismo ou o consumismo.

A acção de um empreendedor que não tem lucro contabilístico, ou que voluntariamente tem prejuízo, pode ser encarada como um consumo livre, que satisfaz uma necessidade de um consumidor - o empreendedor.

Como por outro lado os clientes desse empreendimento só o são livremente, e só o foram porque aquele consumo era na sua opinião e segundo a sua escada de valores o melhor disponível entre as várias alternativas, também ficarão a ganhar.

A ideia geral é que não é possível elaborar uma "escala" do que é "bom" ou "mau" empreendedorismo, que seja representativa dos interesses dos múltiplos agentes na economia - que essa escala revela-se pela sua livre acção, que por sua vez encarrega-se de a fazer evoluir com a máxima eficiência possível...

AA said...

Quanto ao lucro zero, é uma simplificação, só possível em cenários estáticos— de informação imutável, homogeneamente distribuída, enfim, em condições de laboratório.

A própria acção do mercado encarrega-se a todos os instantes de criar oportunidades de negócio latentes, que desequilibram constantemente o processo pelo qual se atingiria o tal "lucro zero".

É uma teoria útil para explicar os fluxos maiores da economia, não para a prever ou modelar.

Note-se que muitos abusos dessa teoria levaram a crer que a riqueza tenderia para uma constante, e que portanto a economia seria cada vez mais concentrada, e os trabalhadores mais explorados, etc etc etc..

Anonymous said...

Nem preciso mais escrever nada. Já foi feito.

André Azevedo Alves said...

O AA não é austríaco mas disfarça bem...

Subscrevo a 90% a resposta dele e os 10% não são graves. :)