Thursday, September 13, 2007

"Chinatown"

Maria José Nogueira Pinto, em defesa do "comércio tradicional" e da limitação à actividade das "lojas chinesas", escreve:

"A favor deste comércio ameaçado, são muitos os argumentos que se podem aduzir: a morte lenta de certas zonas, a falta de segurança, o descuido do espaço público; o importantíssimo papel deste comércio na coesão social, na sustentabilidade e na identidade de tantos bairros lisboetas; a obrigação de gerir a ocupação e a distribuição do espaço de modo a garantir uma oferta diversificada e equilibrada e, por fim, uma equidade nas condições em que estas actividades se desenvolvem."

Isso poderão ser bons argumentos contra os centros comerciais e as grandes superfícies, mas, na maioria, não me parecem fazer sentido contra as lojas chinesas:

a) "a morte lenta de certas zonas, a falta de segurança, o descuido do espaço público": o que causa isso é deixar de haver "comércio de rua" e, logo, menos movimento. Mas o que é que as lojas chinesas têm a ver com isso? Elas estão na rua, como as outras - quem ia à rua fazer compras no "comércio tradicional", continua a ir à rua fazer compras na "loja chinesa". Mais - como as "lojas chinesas" são mais baratas, haverá mais gente a fazer lá compras (e, portanto, movimento na rua) do que com o "comércio tradicional".

b) "o importantíssimo papel deste comércio na coesão social, na sustentabilidade e na identidade de tantos bairros lisboetas" - eu penso que o comércio que tem esse papel são mais as mercearias e cafés, que não estão em competição com as "lojas chinesas. Mas, mesmo que houvesse por aí uma carrada de mercearias, cafés, padarias, etc. "chinesas" (como acontece com os coreanos - ou os portugueses... - noutros países), em que é que o espírito de bairro era afectado por o dono da mercearia ser chinês?

c) "a obrigação de gerir a ocupação e a distribuição do espaço de modo a garantir uma oferta diversificada e equilibrada" - por fim, um argumento que poderá ter alguma lógica. Realmente, faz algum sentido que se procure que, numa dada zona, haja um mínimo de restaurantes, sapatarias, livrarias, lojas de animais, etc. (e, nas suas "ruas privadas", os centros comerciais fazem exactamente isso). No entanto, não sei se isso não seria melhor tratado a nível de juntas de freguesia do que do município. E, seja como for, parece-me haver uma contradição entre isso e, depois, querer criar um bairro só de lojas chinesas.

d) "e, por fim, uma equidade nas condições em que estas actividades se desenvolvem" - eu nem percebo bem aonde MJNP quer chegar com isto.

Finalmente, fará sentido esta distinção entre "lojas chinesas" e "comércio tradicional"? - afinal, uma "loja chinesa" é muito parecida com o "comércio tradicional" de aldeia, com as suas lojas que têm (ou tinham) de tudo.

2 comments:

Luís Bonifácio said...

As lojas chinesas têm que cumprir exactamente com a mesma legislação que os restantes estabelecimentos comerciais (Horários de trabalho, produtos devidamente etiquetados, acondicionados e nos locais próprios, etc).

Partindo do príncipio de que são cumpridoras, então podem estar localizadas onde os seus proprietários assim o entenderem.
Mesmo que isso não agrade à Maria José.

JoaoMiranda said...

Em relação à d) o que ela insinua é que as lojas chinesas vendem produtos com origem ilegal. Mas é para esses casos que serve a ASAE.

Em relação à c), faz pouco sentido uma gestão da diversidade das lojas se nem sequer há uma gestão dos espaços comuns. O centros comerciais têm uma política de diversidade das lojas, mas também têm uma política comum de segurança, de lojas âncora, de publicidade, de horários de abertura obrigatórios e de eventos.

Ah, e os centros comerciais que têm uma política de diversidade das lojas são os que não dispõem de lojas fechadas. Os outros aceitam qualquer loja só para não terem um espaço vazio. Quem lê a Nogueira Pinto até fica com a sensação que o centro de Lisboa está a abarrotar de lojas.