Há tempos, Ana Rita Ferreira sugeria um sistema eleitoral de tipo "alemão". Nos comentários, gerou-se um debate, com Daniel Oliveira dizendo que tal ia levar à bipolarização eleitoral, com os votos a serem concentrados nos grandes partidos, e Luís Lavoura a dizer que não.
Como disse nos comentários, a melhor maneira é ir ver os resultados eleitorais nos países que têm o sistema "alemão" (o "sistema proporcional misto") e conferir se há efectivamente essa tendência para os votos se concentrarem nos grandes partidos.
Assim, vamos ver os países/regiões que usam esse sistema - Alemanha, Nova Zelândia, Pais de Gales e Escócia (também é usado na Bolívia, Lesoto e Venezuela, mas acho que a situação politica desses países é pouco comparável com a nossa; Ontário também esteve para o usar, mas a ideia foi rejeitada anteontem), e comparar com Portugal (onde os 2 maiores partidos tiverem, em conjunto, 73,8% dos votos).
Na Alemanha, em 2005, a CDU/CSU e o SPD tiveram, na votação nacional, 69,4% dos votos; na Nova Zelandia, em 2005, Trabalhistas e Nacionais tiveram 80,2%; em Gales, em 2007, os Trabalhistas e o Playd Cymru (regionalista) tiveram 51%; e na Escócia, em 2007, o SNP e os Trabalhistas tiveram 60,2%.
É verdade que a baixa bipolarização em Gales e na Escócia pode ser explicada por aí, além da divisão esquerda-direita, haver a divisão regionalistas/partidos nacionais; no entanto, olhando só para a Alemanha (menos bipartidária que Portugal) e para a Nova Zelândia (mais bipartidária), não me parece que o "sistema proporcional misto", comparado com o português, só por si, leve a mais bipolarização - e convém lembrar que a Nova Zelândia teve um sistema maioritário durante quase século e meio, até 1996, o que, concerteza é uma das razões para a concentração de votos nos grandes partidos.
Mas, não haverá tendência, como o Daniel Oliveira sugeria, para as eleições uninominais levarem a uma concentração de votos nos candidatos locais dos grandes partidos e que, por arrastamento, haja também essa concentração no voto nacional?
Acho que não, mas antes vou explicar um mal-entendido frequente.
É usual dizer-se que, no "sistema alemão", metade dos deputados são eleitos por sistema maioritário em círculos uninominais, e que a outra metade é eleita num circulo nacional, proporcionalmente à votação - e, aliás, parece-me que Ana Rita Ferreira escreveu o seu post nessa premissa.
Não é assim (isso é no chamado "sistema russo" - que já foi abandonado pela Rússia - ou "sistema maioritário misto") - efectivamente, no "sistema alemão", metade dos deputados são eleitos por sistema maioritário uninominal, mas a outra metade não é eleita proporcionalmente - os deputados do circulo nacional são distribuidos de forma a que o total dos deputados seja proporcional.
P.ex, imaginemos que Portugal estava dividido em 115 circulos uninominais e um circulo nacional de 115 deputados, e que o PS, com 45% dos votos, tinha ganho em 75 círculos uninominais. Nesse cenário, o PS não iria eleger 52 deputados (= 45% * 115) no circulo nacional, mas sim 29 ( 45% * 230 - 75).
Ora, num sistema desses, quase não há incentivo ao "voto útil" - porque razão é que, nos círculos locais, os eleitores de esquerda iriam concentrar os seus votos no PS ou os de direita no PSD, se isso nada afecta o resultado final? Um deputado do PS (ou do PSD) eleito no circulo local apenas significa menos um deputado do PS (ou do PSD) eleito no circulo nacional!
Só vejo duas razões para o "voto útil", e nenhuma me parece causadora de bipolarização - por um lado, um eleitor até pode ter uma grande simpatia pelo candidato de um grande partido no seu circulo e votar nele para ser esse candidato (e não outro do mesmo partido) a ir para o parlamento, mas esse tipo de razão não me parece que vá contaminar o voto para a lista "nacional". Por outro lado, efectivamente, é possível que um deputado de dado partido eleito no circulo local não signifique menos um deputado no circulo nacional - no caso de ser de esperar que esse partido eleja tantos deputados nos círculos locais que não tenha direito a nenhuns no circulo nacional; no entanto, nesse caso é que não há mesmo razão para votar igual nos dois votos - se há fortes probabilidades do partido em que votei no circulo local não ter direito a deputados no circulo nacional, aí o "voto útil" é, exactamente, partir o voto e dar cada qual ao seu partido (já que dar ao voto nacional ao mesmo partido que o local era desperdiçar um voto, já que não iria eleger nenhum deputado adicional).
Como disse nos comentários, a melhor maneira é ir ver os resultados eleitorais nos países que têm o sistema "alemão" (o "sistema proporcional misto") e conferir se há efectivamente essa tendência para os votos se concentrarem nos grandes partidos.
Assim, vamos ver os países/regiões que usam esse sistema - Alemanha, Nova Zelândia, Pais de Gales e Escócia (também é usado na Bolívia, Lesoto e Venezuela, mas acho que a situação politica desses países é pouco comparável com a nossa; Ontário também esteve para o usar, mas a ideia foi rejeitada anteontem), e comparar com Portugal (onde os 2 maiores partidos tiverem, em conjunto, 73,8% dos votos).
Na Alemanha, em 2005, a CDU/CSU e o SPD tiveram, na votação nacional, 69,4% dos votos; na Nova Zelandia, em 2005, Trabalhistas e Nacionais tiveram 80,2%; em Gales, em 2007, os Trabalhistas e o Playd Cymru (regionalista) tiveram 51%; e na Escócia, em 2007, o SNP e os Trabalhistas tiveram 60,2%.
É verdade que a baixa bipolarização em Gales e na Escócia pode ser explicada por aí, além da divisão esquerda-direita, haver a divisão regionalistas/partidos nacionais; no entanto, olhando só para a Alemanha (menos bipartidária que Portugal) e para a Nova Zelândia (mais bipartidária), não me parece que o "sistema proporcional misto", comparado com o português, só por si, leve a mais bipolarização - e convém lembrar que a Nova Zelândia teve um sistema maioritário durante quase século e meio, até 1996, o que, concerteza é uma das razões para a concentração de votos nos grandes partidos.
Mas, não haverá tendência, como o Daniel Oliveira sugeria, para as eleições uninominais levarem a uma concentração de votos nos candidatos locais dos grandes partidos e que, por arrastamento, haja também essa concentração no voto nacional?
Acho que não, mas antes vou explicar um mal-entendido frequente.
É usual dizer-se que, no "sistema alemão", metade dos deputados são eleitos por sistema maioritário em círculos uninominais, e que a outra metade é eleita num circulo nacional, proporcionalmente à votação - e, aliás, parece-me que Ana Rita Ferreira escreveu o seu post nessa premissa.
Não é assim (isso é no chamado "sistema russo" - que já foi abandonado pela Rússia - ou "sistema maioritário misto") - efectivamente, no "sistema alemão", metade dos deputados são eleitos por sistema maioritário uninominal, mas a outra metade não é eleita proporcionalmente - os deputados do circulo nacional são distribuidos de forma a que o total dos deputados seja proporcional.
P.ex, imaginemos que Portugal estava dividido em 115 circulos uninominais e um circulo nacional de 115 deputados, e que o PS, com 45% dos votos, tinha ganho em 75 círculos uninominais. Nesse cenário, o PS não iria eleger 52 deputados (= 45% * 115) no circulo nacional, mas sim 29 ( 45% * 230 - 75).
Ora, num sistema desses, quase não há incentivo ao "voto útil" - porque razão é que, nos círculos locais, os eleitores de esquerda iriam concentrar os seus votos no PS ou os de direita no PSD, se isso nada afecta o resultado final? Um deputado do PS (ou do PSD) eleito no circulo local apenas significa menos um deputado do PS (ou do PSD) eleito no circulo nacional!
Só vejo duas razões para o "voto útil", e nenhuma me parece causadora de bipolarização - por um lado, um eleitor até pode ter uma grande simpatia pelo candidato de um grande partido no seu circulo e votar nele para ser esse candidato (e não outro do mesmo partido) a ir para o parlamento, mas esse tipo de razão não me parece que vá contaminar o voto para a lista "nacional". Por outro lado, efectivamente, é possível que um deputado de dado partido eleito no circulo local não signifique menos um deputado no circulo nacional - no caso de ser de esperar que esse partido eleja tantos deputados nos círculos locais que não tenha direito a nenhuns no circulo nacional; no entanto, nesse caso é que não há mesmo razão para votar igual nos dois votos - se há fortes probabilidades do partido em que votei no circulo local não ter direito a deputados no circulo nacional, aí o "voto útil" é, exactamente, partir o voto e dar cada qual ao seu partido (já que dar ao voto nacional ao mesmo partido que o local era desperdiçar um voto, já que não iria eleger nenhum deputado adicional).
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