[Em 1994] Pedro Arroja defende [defendia?] que os votos devem poder ser vendidos.
Imagine-se que era assim. Vamos supor que alguêm tinha um projecto que implicaria que cada pessoa tivesse que pagar, digamos, 500 euros em impostos para a sua realização (p.ex., um industrial que quisesse construir um complexo de refinarias petroliferas e queria que fosse o Estado a pagar pelos direitos de emissão de CO2). Agora imaginemos que esse alguêm, para conseguir que o Estado fizesse o que ele queria, começava a comprar votos ao preço de 50 euros por voto.
Há primeira vista poderemos pensar que quase ninguém lhe iria vender o seu voto - afinal, se eu recebo 50 euros por vender o meu voto a alguém que o vai usar para me fazer pagar mais 500 euros de impostos, é um prejuizo de 450 euros, logo não lhe iria vender o meu voto.
Mas não é bem assim: afinal, se ele conseguir comprar votos suficientes para que o projecto vá avante e eu tiver vendido o meu voto, perco 450 euros; se eu não tiver vendido o meu voto, perco 500 euros. Por outro lado, se não tiverem sido comprados votos suficientes e eu tiver vendido o meu, tenho um "lucro" de 50 euros; caso eu não tenha vendido o meu voto, não ganho nem perco nada.
Ou seja, vender o voto é sempre a opção mais vantajosa - em qualquer dos casos, ganho sempre mais (ou perco sempre menos) 50 euros se vender o voto do que se não o vender. E, sendo a opção mais vantajosa, provavelmente seriam comprados votos suficientes para conseguir a maioria e o tal projecto iria para a frente, ficando quase todos a perder: os que venderam o voto, iriam perder 450 euros; os que não o venderam, 500 euros. Refira-se que esses ultimos seriam bastantes, já que o comprador de votos tem todo o interesse em, quando tiver votos suficientes, não comprar mais nenhuns, por duas razões: por um lado, uma razão óbvia - sai mais barato comprar 51% dos votos do que 75% e o proveito é o mesmo; além disso, sabendo-se que, a certa altura, ele vai deixar de comprar votos, é um forma de pressionar os eleitores a lhe venderem o voto (já que, se ficarem muito tempo a pensar, podem perder a oportunidade).*
Conclusão: a compra e venda de votos iria facilmente originar situações em que os eleitores, mesmo fazendo o que é racionalmente melhor para eles, iriam (em termos de efeito agregado) produzir resultados prejudiciais a eles próprios (claro que isso também pode acontecer actualmente, mas a transacionabilidade do voto iria reforçar esse problema).
*Imagino que seja para prevenir estes casos que, quando alguêm compra mais de não sei quantos por cento do capital de uma SA, é obrigado a lançar uma OPA sobre 100% do capital.
Imagine-se que era assim. Vamos supor que alguêm tinha um projecto que implicaria que cada pessoa tivesse que pagar, digamos, 500 euros em impostos para a sua realização (p.ex., um industrial que quisesse construir um complexo de refinarias petroliferas e queria que fosse o Estado a pagar pelos direitos de emissão de CO2). Agora imaginemos que esse alguêm, para conseguir que o Estado fizesse o que ele queria, começava a comprar votos ao preço de 50 euros por voto.
Há primeira vista poderemos pensar que quase ninguém lhe iria vender o seu voto - afinal, se eu recebo 50 euros por vender o meu voto a alguém que o vai usar para me fazer pagar mais 500 euros de impostos, é um prejuizo de 450 euros, logo não lhe iria vender o meu voto.
Mas não é bem assim: afinal, se ele conseguir comprar votos suficientes para que o projecto vá avante e eu tiver vendido o meu voto, perco 450 euros; se eu não tiver vendido o meu voto, perco 500 euros. Por outro lado, se não tiverem sido comprados votos suficientes e eu tiver vendido o meu, tenho um "lucro" de 50 euros; caso eu não tenha vendido o meu voto, não ganho nem perco nada.
Ou seja, vender o voto é sempre a opção mais vantajosa - em qualquer dos casos, ganho sempre mais (ou perco sempre menos) 50 euros se vender o voto do que se não o vender. E, sendo a opção mais vantajosa, provavelmente seriam comprados votos suficientes para conseguir a maioria e o tal projecto iria para a frente, ficando quase todos a perder: os que venderam o voto, iriam perder 450 euros; os que não o venderam, 500 euros. Refira-se que esses ultimos seriam bastantes, já que o comprador de votos tem todo o interesse em, quando tiver votos suficientes, não comprar mais nenhuns, por duas razões: por um lado, uma razão óbvia - sai mais barato comprar 51% dos votos do que 75% e o proveito é o mesmo; além disso, sabendo-se que, a certa altura, ele vai deixar de comprar votos, é um forma de pressionar os eleitores a lhe venderem o voto (já que, se ficarem muito tempo a pensar, podem perder a oportunidade).*
Conclusão: a compra e venda de votos iria facilmente originar situações em que os eleitores, mesmo fazendo o que é racionalmente melhor para eles, iriam (em termos de efeito agregado) produzir resultados prejudiciais a eles próprios (claro que isso também pode acontecer actualmente, mas a transacionabilidade do voto iria reforçar esse problema).
*Imagino que seja para prevenir estes casos que, quando alguêm compra mais de não sei quantos por cento do capital de uma SA, é obrigado a lançar uma OPA sobre 100% do capital.
4 comments:
Miguel,
É preciso ter em conta a opção zero. Nada garante que num sistema eleitoral convencional o projecto não será feito à mesma. Afinal, se há dinheiro envolvido a empresa pode subornar directamente o partido que ganhar as eleições. O projecto é feito à mesma, o eleitor paga à mesma os 500 euros. Com o sistema de venda de votos pelo menos alguns eleitores têm desconto.
A vantagem do sistema de venda de votos é que o mercado é mais eficiente e o eleitor vende o seu voto pelo melhor preço.
Tomemos o exemplo da OTA. No sistema convencional a OTA custa 5 000 milhões e o voto do eleitor rende zero. O eleitorado paga 5 000 milhões.
Num sistema de venda de voto, o eleitor poderia vender o seu voto por digamos, 500 milhões. A OTA ficaria por 4 500 milhões ao eleitorado.
esta questão de votos, e pelos vistos já não é só um lunatico a defender a venda do voto, é uma questão de principio.
em democracia, e por isso e´que ela existe, somos todos iguais, pois temos o mesmo peso politico.
segundo, a democracia ainda não está à venda, é isso que o yesmen arroja está no fundo a defender. o dinheiro não é tudo, ou então vamos começar a levar a sério aquela parte do "lado positivo da escravatura".
terceiro, quem quiser dispensar o seu voto, como eu, por razões de principio, ou por outras, não vota . ou por desinteresse ou por andar na lua ou o que quer que seja.
como anarquista, tenho a convicção que o istema já esytá "virado" para um lado, mas com este tipo de posições só se traz isto à luz do dia.
caro joão miranda, essa situação que referiu é, nem mais nem menos, a legalização do suborno.
ainda existe é verdade, mas longe vai o tempo em que para se dar bem com os Senhores faziam-se favorzinhos.
só mais uma coisa... só porque uma besta qualquer que se está a borrifar para a democracia e para a republica, não lhe dá o direito de dar a outra pessoa o poder de ter mais poder do que eu.
se se está a borrifar que se lixe que faça o que entender, menos usar o direito que ele não usufrui contra mim.
"Tomemos o exemplo da OTA. No sistema convencional a OTA custa 5 000 milhões e o voto do eleitor rende zero. O eleitorado paga 5 000 milhões."
a longo prazo é um investimento que rende a todos.
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