A propósito do Dia da Libertação dos Impostos, este ano previsto para 19 de Maio, transcrevo este meu post de 18/06/2006:
Pelos vistos, hoje é o "Dia da Libertação dos Impostos"[pdf], ou seja (usando os termos da TVI), "O primeiro dia do ano em que os portugueses já cumpriram as obrigações fiscais é esta quinta-feira e por isso os portugueses começam agora a trabalhar para as próprias carteiras. Os trabalhadores gastaram 137 dias ou seja, um terço do ano, só para pagar os impostos no ano passado".
Na verdade, o DLI é, parcialmente, uma mistificação: imagine-se duas pessoas, o Fernando, ganhando 1.000 euros/mês e pagando 20% de impostos e o Mario, ganhando 500 euros/mês e pagando 10% de impostos. Assim, o Fernando trabalha 73 dias por ano para pagar os impostos (365*20%) e o Mario 36,5 dias, ou seja, em média trabalham 55 dias por ano para pagar impostos.
Agora, vamos aplicar a metodologia do "DLI": pegamos nos impostos totais (3.000=200*12+50*12), divide-se pelo rendimento total (18.000=1.000*12+500*12) e multiplica-se por 365 dias e temos o resultado de 60 dias.Ou seja, com um sistema fiscal progressivo os contribuintes, em média, trabalham menos dias "para o Estado" do que o valor calculado para o DLI.
Também podemos fazer o raciocinio inverso: imagine-se um sistema fiscal em que todos os contribuintes pagassem o mesmo, à maneira da malograda "poll tax" de Tatcher (um caso extremo de regressividade) - assim, se tanto o Fernando como o Mario pagassem 125 euros/mês de imposto, o Fernando iria trabalhar 46 dias para impostos e o Mario 91 dias, ou seja, em média trabalhariam 68 dias (mas o cálculo do DLI continuaria a indicar 60 dias). Assim, com um sistema regressivo os contribuintes trabalham mais dias "para o Estado".
Claro que o DLI pode ter alguma utilidade para ilustrar as diferenças de carga fiscal entre paises (ou entre anos), mas o discurso associado ("os portugueses trabalharam 137 dias para pagar impostos") é um bocado demagógico (OK, admito que no meu blog também deve haver muita coisa demagógica...), ainda mais quando muitos dos propagandistas do DLI são também entusiastas da "flat tax", que (ao reduzir a progressividade fiscal) até poderia aumentar o número de dias que realmente trabalhamos para pagar impostos.
Ainda acerca do DLI (no contexto dos EUA):
Observações:
Escrevi que o DLI, apesar de tudo, poderia ter alguma utilidade para ver as diferenças de carga fiscal entre anos: realmente, a carga fiscal está a crescer (cada ano, o DLI avança um dia)
A minha crítica ao DLI baseia-se na progressividade dos impostos, mas será que eles são tão progressivos como eu penso? Afinal, acho a principal fonte de receitas do Estado é o IVA, que há quem argumente que é regressivo (há polémica a esse respeito).
No comments:
Post a Comment