Sunday, April 26, 2009

Os alunos que não querem tirar o 12º ano

No debate sobre o alargamento da escolaridade obrigatória, de ambos os lados parece-me haver pouco respeito pelos alunos que não querem tirar o 12º ano.

Do lado dos defensores do alargamento, o pouco respeito é óbvio.

Do lado dos opositores, também se ouve/lê (sobretudo nos comentários on-line dos jornais e blogues) muita conversa na linha "esses alunos que não têm motivação para estudar só vão incomodar os outros". Até é capaz de ser verdade, mas o facto de muita gente apresentar isso como sendo, aparentemente, o problema principal indica que também não os incomoda por aí além que milhares de jovens sejam obrigados a estar mais 3 anos na escola sem sentirem qualquer vontade de tal (o que os incomoda é isso poder prejudicar os outros, os que querem frequentar a escola).

Nota: não se deduza daqui uma objecção absoluta e de principio ao alargamento da escolaridade obrigatório ou mesmo ao conceito em si. Mas acho que, na altura de decidir do aumento ou não da escolaridade obrigatória, e portanto de pesar os prós e os contras de cada opção, um "contra" a ser considerado é obviamente obrigar milhares de pessoas a terem que fazer algo que prefeririam não fazer; e parece-me que nenhum dos lados dá grande importância a esse contra.

3 comments:

Anonymous said...

Será que somos todos iguais? nem as máquinas que saem das fábricas são todas iguais: algumas saem da linha de fabrico com defeito. senão para que serve o controlo de qualidade?

As reprovações nas escolas públicas vão ser gradualmente banidas e a tendência será a de que ao fim de 12 anos de escola todos os alunos possam ter o 12.º ano de escolaridade, fazendo subir com isso os índices de escolarização dos portugueses. O nível de conhecimentos adquiridos será inevitavelmente muito baixo, mas o que importa são as ESTATÍSTICAS, e assim Portugal poderá figurar "orgulhosamente" na lista de países com maior número de anos de escolaridade.

O 12.º ano vai ser em breve a escolaridade mínima obrigatória. Embora os jovens passem a sair do sistema de ensino com poucos conhecimentos académicos, pelo menos, enquanto por lá andam também não figuram nas estatísticas dos desempregados, o que também é bom para as tais ESTATÍSTICAS.

Assim, o facto de virem a exibir o certificado de habilitações do 12.º ano deixará em breve de dar qualquer indicação às entidades empregadoras relativamente às reais qualificações dos jovens que então vão sair das escolas e, em consequência, terão que ser as entidades empregadoras a testar os conhecimentos dos candidatos aos empregos que oferecerem. Não começaram já a fazê-lo há algum tempo?

Os alunos que frequentarem as escolas públicas poucas possibilidades terão de atingir os necessários conhecimentos para prosseguirem os estudos. Assim, os pais que desejem para os seus filhos um curso superior terão que começar a consciencializar-se desde já que a escola pública não será o caminho aconselhável para a preparação dos seus filhos, mesmo que sejam crianças inteligentes e interessadas. O ambiente não será o melhor para que tenham sucesso por vários motivos:

1.º) na mesma sala coexistirão muitos alunos com fracos conhecimentos, porque não havendo reprovações, não haverá necessidade de empenho, nem nos estudos, nem na assiduidade às aulas;
2.º) com o fim do ensino especial terão por colegas jovens com deficiências várias: auditivas, de comunicação e até psíquicas;
3.º) nem todos os jovens são iguais: há génios, mais ou menos inteligentes e até jovens com capacidade de aprendizagem muito limitada. Mas a escolaridade obrigatória é para ser conseguida por todos eles. Quem não a conseguir nunca será um verdadeiro cidadão e poderá nem ter acesso a tirar uma simples carta de condução para ser um mero distribuidor de bilhas de gás.
4.º) porque todos os jovens são obrigados a frequentar a escola enquanto menores, mesmo que por ela não revelem qualquer interesse, terão por colegas outros jovens que apenas por lá andam porque o sistema a isso os obriga. Alguns deles utilizam a escola, os colegas e até os professores para se divertirem, gozando-os e boicotando as aulas.
Estes jovens de 16, 17 e 18 anos que se desinteressam da escola e que por lá andam apenas porque a isso são obrigados, deveriam ser encaminhados para o mercado de trabalho. Assim, prejudicam os professores, os colegas e perdem hábitos de trabalho. Dificilmente poderão um dia vir a ser úteis a esta sociedade doente em que vivemos.

Enfim, o Ensino vai de mal a pior!

Zé da Burra o Alentejano

Miguel Madeira said...

O comentário anterior ilustra o que escrevi no post sobre as motivações de grande parte dos críticos aos 12 anos obrigatórios.

garaujo said...

12 anos de escolaridade obrigatória
Os Equívocos

Recentemente, o 1º ministro José Sócrates anunciou a implementação da obrigatoriedade de frequência escolar de 12 anos, aplicável a partir de 2009/2010 e seguintes, a todos os jovens que se inscrevam no 7º ano.

A medida é correcta e já tinha sido apontada como necessária pelos governos de coligação PSD-PP anteriores ao actual.

O primeiro equívoco não é do Governo. É dos jornalistas e de – curiosamente – muitos responsáveis que comentam a decisão: a confusão entre uma escolaridade de 12 anos e a conclusão do 12º ano.

Até hoje, a escolaridade básica eram 9 anos (1º ao 9º ano) e a escolaridade obrigatória de 9 anos. Daí adveio a confusão. Entre os dois 9 (noves). A verdade é que nunca foi obrigatório que todos concluíssem a escolaridade básica (o 9º ano). Mas tão só que ficassem 9 anos, aí sim, de forma obrigatória, no sistema. Os alunos ficam “livres” de o deixar, ao completarem 16 anos antes do início do ano lectivo.

O 9º ano só é concluído em 9 anos nos casos em que a carreira do aluno é imaculada. Sem “chumbos”. Assim, é só nesse caso, que a conclusão da escolaridade obrigatória é simultânea com o termo do 9º ano.

A verdade é que esses casos seriam apenas alguns. Sempre cada vez mais, mas ainda longe de números que pudéssemos considerar como razoáveis.

E ali estava o problema. Muitas vezes, apesar da escolaridade obrigatória estar cumprida, a conclusão do 9º ano ficava muito longe para uma grande fatia dos alunos. Devido aos anos “repetidos” que originava atrasos na frequência. O que não é bom para os alunos e para o País.

Agora, a Escolaridade Básica vai continuar a ter 9 anos (1º ao 9º ano) mas passará a ser obrigatório ficar na escola (ou em formação), durante 12 anos.

Chegamos então, ao segundo equívoco. Este já de uma maioria considerável dos intervenientes, onde se incluem os responsáveis governativos: ao contrário do que vêm referindo, o alargamento da escolaridade obrigatória a 12 anos pouco irá influir no Ensino Secundário e não terá absolutamente nada a haver com o 12º ano…

Os grandes problemas estão bem identificados, nas situações de abandono precoce. Ou seja, no grupo de alunos que, ao atingir os 16 anos optavam por sair da escola. Encontrando-se, estes, nos 6º, 7º, 8º ou 9º anos. Ou seja, acumulando insucessos no ensino básico pelo que, muito longe de poderem almejar atingir (e muito menos concluir) o Secundário.

Esta saída precoce, destes alunos, do sistema (no qual não se identificavam) era, muitas vezes, uma benesse para as Escolas. E por razões entendíveis: afinal, esses alunos eram referenciais pouco interessantes para os restantes alunos e focos de instabilidade e problemas para o estabelecimento.

Mas são estes jovens que, agora, sentirão a mudança da lei: terão que ali (nas escolas) “penar” mais 3 anos. Não no Secundário, mas no Básico. Onde estão agora, sem perspectivas de ir muito mais longe. Com as óbvias implicações ao serem impedidos, antes dos 18 anos, de aceder ao mercado de trabalho. Serão mais problemas para as escolas e professores que os terão que aguentar mais 3 anos. Mais velhos, maiores, menos “controláveis”, mais frustrados, mais incompreendidos.

A notícia que a idade de empregabilidade se manterá nos 16 anos é contraditória. A não ser que esses jovens (16-18 anos) se mantenham em simultâneo, no mercado de trabalho e em frequência escolar/formativa.

O que nos leva ao 3º equívoco. A bolsa de estudo. Para os alunos no Secundário com aproveitamento. O que constitui um “tiro” completamente ao lado. Como vimos, o que esta nova lei vai acrescentar (e manter mais 3 anos no sistema) são alunos no Básico e sem aproveitamento regular. E são estes alunos os que terão que ser apoiados. Caso contrário, teremos um “inferno na Terra” para eles, para os outros alunos, para os professores e para as suas Escolas.

A bolsa de estudo para os alunos do Secundário, com aproveitamento, servirá para aqueles que, sem ela, estariam ali mesmo. Não acrescentará nada ao crescimento da escolaridade, sem prejuízo da oferta ser-lhes (a esses alunos) pessoalmente interessante (afinal é-lhes dado dinheiro).

Ainda não se entendeu se a atribuição da bolsa será feita juntamente com o Abono de Família, pelo sistema da Segurança Social (deverá ser assim, para simplificação administrativa) ou através do sistema da Acção Social Escolar (processo muito mais complicado).

Escrevi no início que a medida é boa. E é.

O grande impacto será vivido na possibilidade de mais alunos concluírem a escolaridade básica. Pois 9 anos obrigatórios, para estes alunos com insucesso acumulado, não chegavam para, sequer, concluir a Escolaridade Básica. Agora com 12 anos, isso passará a será possível.

Mas isto não é suficiente. Fazer a lei é fácil. Assegurar os resultados objectivados, é mais difícil.

Mas é possível. E como:

Assegurando a multiplicação de ofertas de formação profissional de nível II (e não de nível III, conforme é usual se ouvir falar), de preferência nas Escolas de Ensino Secundário onde as idades dos alunos agora “retidos” no sistema se equivalerão às dos restantes, facilitando a sua integração. Nas zonas de população mais rarefeita, será necessário garantir transportes regulares para garantir o acesso desses alunos aos locais e escolas devidas. A idade (mais avançada) dos alunos facilita o processo (distâncias maiores a percorrer).

Por outro lado, haverá que incrementar os Cursos de Educação Formação que atribuem profissionalização de nível II a fim de os disponibilizar aos alunos, que, já perto dos 18 anos, concluem o Básico mas já não estão dispostos a continuar no sistema ao longo dos mais 3 anos que constituem o Secundário. Aí entram esses cursos com durações de 1 ano que acrescentam uma componente profissional ao Ensino Básico já concluído.

Realmente, como diz a Ministra, não deverá haver grande acréscimo imediato de alunos no sistema. Daí não se dever esperar grandes incrementos na oferta de trabalho docente. Gradualmente haverá mais alunos, mas contrabalançados com a redução demográfica, o seu número deverá manter-se mais ou menos estável ou com uma variação gradual positiva reduzida.

As ofertas prévias na Educação Pré-Escolar (alargamento da sua frequência) e numa Escola a Tempo Inteiro de qualidade, reduzirão o insucesso e permitirão, primeiro, que a conclusão da escolaridade básica possa ser, efectivamente, generalizada e que, depois, então, se aumente o mais possível e de forma sustentada o nível médio formativo dos jovens portugueses para além do Ensino Básico.

Finalmente:

A bolsa de estudo anunciada é um tiro falhado. Que custará 150 milhões de euros anuais dentro de poucos anos. Ora, não se entende para que serve.

Afinal, aqueles alunos são apoiados pela Acção Social Escolar para efeitos de acesso a livros, material escolar, transportes, alimentação, acesso à banda larga. Já quase tudo gratuito. Antigamente, a bolsa de estudo (e bem) justificava-se para os casos em que a escolaridade obrigava à frequência escolar em estabelecimentos distantes, servindo para financiar uma morada de recurso.

Assim, para que servirá este dinheiro dado assim, de forma avulsa? Não quero nem sugerir algumas aplicações (tão erradas quanto possíveis).

Muito mais correcto seria aplicar esse dinheiro no reforço dos apoios ASE, aplicáveis a todos os alunos com mais de 16 anos (sim, também do básico e sem considerar o facto do aluno não ter obtido, pontualmente, aproveitamento) de forma muito mais criteriosa (criar crédito para determinados usos) e, talvez, suportar estágios – por inteiro - nas empresas que aceitem alunos a frequentar cursos de nível II. Incluindo compensação às empresas e aos alunos (neste caso, substituindo-se ao emprego agora impossibilitado).

O acesso precoce destes jovens, já nesta fase (estágios nas empresas) ao sistema da Segurança Social (habilitando esses jovens aos benefícios correspondentes) também poderia ser analisado e financiado pelo Estado (ao invés da atribuição inútil das bolsas).

Considero que é aqui que se deverá centrar o esforço máximo a fazer nos próximos anos. Mesmo que, ganha a primeira aposta e ultrapassada a primeira fase, tudo se possa transferir para o nível seguinte: secundário e formação de nível III. Mas por agora, ainda estaremos longe (talvez 10 anos) disso.