Murray N. Rothbard aponta o caso como interessante, dado que o argumento usado envolvia considerar “ilegal e inconstitucional”o sistema de reservas parciais.
Reparar que existe um argumento básico sobre a questão do crédito concedido por criação monetária como fraudulento. Só é possível na medida em que um prestador de um serviço de depósitos deixou de estar obrigado a conservar a coisa depositada.
“Depósito” devia ser um depósito civil (existe aquela coisa do “labelling” com o qual as DECOs deste mundo costumam até estar atentas) e assim, uma moeda de ouro depositada deve corresponder a uma moeda de ouro guardada. Uma moeda de ouro emprestada ao Banco devia ser uma operação de crédito ao Banco. Dois nomes diferentes e contabilizadas de forma diferente.
Os Bancos desde muito cedo descobriram que podiam criar notas e depósitos de moedas de ouro inexistentes para conceder crédito (coisa rentável), assim, os depositantes não percebessem que a probabilidade de poder levantar o depósito diminuía, além de que formalmente –legalmente - o contrato estava quebrado.
O problema legal aqui é de índole de filosofia de direito. Quanto existe uma entidade com o Monopólio da Violência e Direito (Estado), esta tem a capacidade de tornar legal o que é ilegal. Até que ponto passa a ser legal? Na medida em que tem a capacidade de impor que a sociedade se comporte como sendo legal. Os juristas neste ponto encolhem o ombro.
Imaginemos que eu lanço um serviço de guarda de CDs dos Xutos e Pontapés. X pessoas depositam o seu CD comigo e eu passo um recibo de depósito. Depois começo a emprestar CDs a troco de dinheiro temporariamente. Isto é obviamente ilegal, (ver código civil).
Adicionalmente crio recibos de depósitos que vendo a terceiros, que estes utilizam como oferta para terceiros (em vez de oferecerem o CD físico) onde um número elevado nunca chega a pedir o CD físico, bastando-lhe saber que tem um recibo que dá direito a um CD.
Depois, o Estado “legaliza” a prática. È legal? Parece que sim. No limite, tudo é legal que seja declarado legal. O que costuma preocupar os juristas é se o processo de aprovação passou todos os requisitos formais anteriormente estabelecidos. A única hipótese de rejeição é conseguir encontrar um argumento formal, recorrendo a textos (Constituição, etc) que contradigam a interpretação actual. Mas claro está, mesmo nesse caso, se for esse caso, pode, ser revistos todas as cláusulas que provem contradição e fica tudo… legal.
Quanto a quem é prejudicado. Os depositantes só podem ser prejudicados. Num sistema de 100% de reservas, onde depósito significa depósito, todo o crédito concedido pelo banco obriga a que este tenha de convencer um depositante a conceder crédito ao banco, e vez de o conservar em depósito. Isso assegura que todo o investimento a crédito é possível porque existiu uma poupança prévia e que está voluntariamente disposta a esperar N por voltar a readquirir o depósito. Em tal sistema, os detentores de pequena poupança até podem guardar o dinheiro sem utilizar entidades bancárias porque este valorizará alguma coisa (deflação), dado que todo o crescimento económicos se traduzirá em descida de preços. Num sistema de inflação permanente (como o nosso), guardar dinheiro significa perder dinheiro. Por isso o "sistema" gosta de inflação, pelo menos alguma coisa para obrigar a colocá-lo no "sistema". Os Bancos agradecem. E quanto mais existe no sistema, mais conseguem estender a criação monetária até ao limite do multiplicador (um milagre que antes era apenas atribuido a Cristo).
Quem é beneficiado. O Banco que consegue negócio adicional com pouco esforço (esta prática foi tentada e abusada desde cedo pelo lucro oferecido por algo que era notoriamente uma fraude formal-legal, por isso durante séculos o negócio bancário era rodeado de secretismo e muito low profile). Também é beneficiado quem recebe o crédito e o gasta primeiro que os outros. Numa altura de expansão de crédito-monetário, beneficia muito quem consegue tirar partido das bolhas e sai deles a tempo, claro Por isso o sistema beneficia “Wall-Street”, até porque quando a coisa corre mal, o “sistema” providencia toda a criação de dinheiro necessária para salvar (quando é possível) os negócios (Bancos, empresas, etc) à custa da inflação que afecta toda a população. Ou seja, "o caso à esquerda contra os Bancos Centrais"...
Posteriormente vou debruçar-me sobre outros pontos específicos levantados pelo Miguel Madeira.
Tuesday, January 29, 2008
Re. Ainda sobre bancos centrais, expansão monetária, etc.
Publicada por CN em 20:52
Etiquetas: Textos de Carlos Novais
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1 comment:
Não sei se será certo que impor reservas legais de 100% aos bancos implicaria obrigatoriamente um ambiente não inflacionário. Um banco central que continue a adquirir títulos no mercado ou ceda liquidez a taxas baixas manteria certamente uma forte expansão monetária se assim o desejasse. A liquidez adicional que os bancos recebessem seria obviamente transmitida aos particulares via expansão do crédito. Alias como no actual sistema mas com diferente taxa de reservas legais.
A diferença do que se passa actualmente para esse cenário de 100% de reservas legais é que os bancos não poderiam ceder os depósitos em empréstimos já que estaria obrigado a deter todos esses depósitos como reservas.
Esse sistema teria como vantagem óbvia o controlo muito maior por parte do banco central da massa monetária de uma económia, com potenciais benefícios de estabilização macroeconómica (ou destabilização dessa política mas isso é outra história). Por exemplo nesse cenário a grande depressão não seria tão severa se os bancos não pudessem de um momento para o outro aumentar as suas reservas (pois estas estavam barradas no limite 100%) reduzindo assim a oferta monetária e agravando a depressão.
No entanto parece-me que está a falhar um argumento importante que é o do papel de intermediário financeiro dos bancos. A existência de reservas legais baixas existe essencialmente para assegurar que o excesso de capital de credores possa ser canalizado eficientemente para os investidores. A existência das reservas prende-se essencialmente com as exigências prudenciais do negócio de intermediação bancário.
No Mises Institute essa discussão da produção de dinheiro fraudulento é já bastante longa (talvez já do próprio Mises) mas parece-me que se prende mais com a defesa de que o banco central não deveria ter a capacidade de emissão monetária. Seria qualquer coisa como um currency board (está-me a falhar a designação em português) em que a emissão monetária está consignada às reservas do Banco central (neste caso está também relacionada com a emissão do banco central emitente da divisa adoptada). Ou pensando num quadro mais hipotético num padrão ouro sem novas descobertas de jazigos e numa economia fechada. Estas limitações impostas ao banco central resultaria num ambiente deflacionário em caso de crescimento económico, beneficiando directamente os credores ou depositantes. No caso de decrescimento económico o ambiente seria inflacionista benefeciando os devedores - as instituições depositárias.
Esta é a minha opinião que devo dizer que não está fortemente fundamentada pois não estou muito por dentro do assunto. Certamente que posso ter interpretado mal o argumento pelo que lhe pediria a sua correcção se assim achar necessário pois certamente que estará muito mais por dentro deste tema que eu.
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