Sunday, February 19, 2006

Já agora, vamos à ciência

Outro exemplo que demonstra que os "ocidentalócentricos" e os "relativistas culturais" estão errados. Muitos falam da ciência "ocidental" (uns usam o adjectivo para elogiar, outros para denegrir). Ora, a maior partes das ciências, hoje em dia, dependem fortemente da matemática (a quintessencia das "ciências duras" e apresentada por alguns como o extremo da "lógica ocidental").

Agora, alguém tente fazer uma conta relativamente complicada usando a numeração romana ou grega...

Se os indianos não tivessem inventado o sistema de numeração decimal e os árabes não o tivessem trazido para a Europa, queria ver alguém fazer uma conta, p.ex., 3683*12/52. Quanto tempo levaria um romano a fazer essa conta? Bem, com uma máquina de calcular ou uma folha de cálculo até seria rápido, mas aposto que, com uma numeração romana, também teria sido muito mais díficil conceber os algoritmos necessários para uma máquina conseguir fazer contas.

4 comments:

Anonymous said...

o simples zero, esse nada que afinal faz a grande diferença. a algebra, a alvenaria, etc...

Anonymous said...

Fazer ciência não é fazer contas! Isto faz-me lembrar um amigo, professor de matemática, que se recusa a fazer contas; "se existem máquinas", diz ele!)
Nota: os números não apareceram devido à necessidade de "fazer ciência".
E isso de ser mais díficil conceber um algoritmo com numeração romana...bem, um algoritmo pode fazer-se de zeros e uns, mais nada...para que é que precisamos do sistema decimal?

Miguel Madeira said...

" Fazer ciência não é fazer contas!"

Não, mas, a mais das vezes, implica fazé-las.

"os números não apareceram devido à necessidade de «fazer ciência»"

Não, mas ajudaram a fazer ciência (como montes de coisas que foram inventadas para um determinado objectivo e depois tiveram aplicação noutros ramos)

"E isso de ser mais díficil conceber um algoritmo com numeração romana.....bem, um algoritmo pode fazer-se de zeros e uns, mais nada...para que é que precisamos do sistema decimal?"

Realmente, não precisamos exactamente do sistema decimal. O que precisamos é de um sistema com duas caracteristicas:

a) que o valor de um algarismo seja determinado pela sua posição no número

b) que tenha o conceito de "zero"

Essas caracteristicas verificam-se, realmente, tanto no sistema decimal como no binário, no hexadecimal, ou em qualquer sistema de numeração de base "x" (e não se verificavam nos sistemas romano ou grego). Mas foram exactamente essas as duas grandes contribuições dos indianos (o facto de terem criado um sistema decimal em vez de duodecimal ou octonal provavelmente deveu-se apenas ao acidente evolutivo de termos 5 dedos em cada mão).

E porque é que têm que ter essas caracteristicas? Porque são esses dois detalhes que permitem estabelecer regras gerais (e relativamente simples) para efectuar as várias operações aritméticas (como aquelas regras que nós aprendemos na escola primária). E é exactamente o facto das as operações aritméticas poderem ser efectuadas através de um conjunto de regras pré-definidas que torna possível serem feitas por uma máquina.

Claro que hoje em dia é perfeitamente possível um computador funcionar com a numeração romana: era só traduzir de romano para binário (como fazem com o decimal), fazer os cálculos em binário, e re-traduzir para romano. Mas, em primeiro lugar, o sistema binário é, ele próprio, uma derivação do decimal; e, em segundo, duvido (pelas razões já apresentadas) que fosse possível fazer uma máquina de calcular que trabalhasse directamente em numeração romana (as primeiras máquinas trabalhavam directamente com o sistema decimal) - assim, como as primeiras máquinas se calhar não teriam sido inventadas, teria sido mais dificil dar o salto para as máquinas de calcular modernas.

Anonymous said...

Miguel, os maias e os chineses também criaram sistemas de numeração posicionais.
Mas não são os numerais que definem a ciência moderna. Esta baseia-se na crítica racional, nasceu na Antiga Grécia, e atingiu a maioridade com Newton. Claro que toda a humanidade deu o seu contributo (e algumas civilizações também o teriam dado se não tivessem entrado em colapso), mas a essência da Ciência encontramo-la nos gregos. Por isso é que, normalmente, se fala da ocidentalidade da ciência (até porque a sociedade que a gerou partiu de outro encontro violento entre Oriente e Ocidente). Mas claro que a ciência não é ocidental, é universal. A sua raiz principal é que pode ser considerada como ocidental.