Sunday, September 23, 2007

A quadrilha de Alberto Gonçalves

No Diário de Noticias, Alberto Gonçalves escreve "o sr. Sá Fernandes é vereador do Bloco de Esquerda, que venera Trotsky, que idealizou os modernos campos de concentração, que encarceraram milhões de pessoas, que morreram às mãos de criminosos, que tentaram impor as maravilhas do autêntico socialismo, que é a utopia do dr. Louçã, que ama Hoxha, que amava Estaline, que se amava a si próprio e que matou toda, ou boa parte, da quadrilha."

Vamos analisar isto aos pedacinhos:

"que venera Trotsky, que idealizou os modernos campos de concentração" - sinceramente, não faço ideia de quem, na direcção do Partido Bolchevique, teve a ideia de começar a meter os opositores em "campos de concentração"; até pode ter sido Trotsky; mas, de qualquer maneira, não sei se terá havido grande "idealização" envolvida: os campos de concentração do regime comunista, na sua essência, eram uma continuação dos trabalhos forçados da Rússia czarista. A diferença seria apenas de quantidade - mais presos que no tempo dos czares.

"os modernos campos de concentração, que encarceraram milhões de pessoas, que morreram às mãos de criminosos, que tentaram impor as maravilhas do autêntico socialismo, que é a utopia do dr. Louçã" - a maior parte dessas pessoas morreram após 1923; como Louçã (acha que, pelo menos desde 1923, esses regimes deixaram de ser o "autentico socialismo", parece-me que os «criminosos que tentaram impor as maravilhas do que Louçã considera "Estado operário degenerado/deformado"» mataram muito mais. Poder-se-à discutir se os defensores do "autêntico socialismo, versão Louçã" não teriam morto tanta ou mais gente se tivessem tido a oportunidade, mas o certo é que não a tiveram.

"a utopia do dr. Louçã, que ama Hoxha" - com esta passagem, Alberto Gonçalves demonstra que não passa de um pateta. Terra chamando Alberto Gonçalves, Terra chamando Alberto Gonçalves: Louçã é trotskista, Hoxha permaneceu um estalinista assumido até ao fim dos seus dias!

Ainda mais, vindo de alguém que se queixa que "a escola trocou a transmissão de conhecimentos pela partilha da ignorância", essa tal ignorância de história das ideias politicas leva a pensar como é que se tiram cursos de sociologia (ou ele estaria já a basear-se na sua auto-avaliação?).

Já que estou com a mão na massa, vou criticar mais umas coisinhas.

A respeito do processo UE vs. Microsoft:

"A Microsoft, para cúmulo da desvergonha, adiciona software gratuito ao Windows e ao Office, e o consumidor, na sua cegueira, recebe os brindes com satisfação."

E se escrevêssemos "A Microsoft obriga os seus clientes a pagar por software adicional quando compram o Windows e/ou o Office, mesmo que não o queiram"? Já não soa tão bem, pois não? Mas é isso que se passa - se o software adicional é distribuído "gratuitamente" junto com o Windows, isso quer dizer que os custos de produção (nomeadamente de desenvolvimento) desse software vêm incorporados no preço do Windows (ou seja, até os utilizadores do Firefox pagam os custos de desenvolvimento do Internet Explorer).

Poderá ser argumentado que é mais cómodo (nomeadamente em termos de redução de "custos de transacção") para o consumidor que o software da Microsoft seja vendido em bloco, em vez de termos que estar a escolher, no acto de compra, que programas queremos ou não, e a calcular o preço em cada situação possível. Seria um bom argumento, mas não tem nada a ver com a conversa de Alberto Gonçalves de "brindes gratuitos".

A respeito do Dia Europeu sem Carros:

"Apesar dos preços aplicados em Portugal insinuarem o contrário, o automóvel é um produto de venda livre. O consumidor que adquire um carro fá-lo na presunção de que o poderá utilizar, a gosto, nas vias públicas destinadas ao efeito. A presunção, embora apoiada na lei, depara-se com obstáculos arbitrariamente levantados pelos poderes políticos. Uma vez por ano, dezenas de autarquias resolvem aderir ao Dia Europeu Sem Carros."

Pode haver muitos argumentos contra o Dia Europeu sem Carros (até eu acho que tende a ser uma fantochada que funciona como publicidade a favor do uso do automóvel). Mas essa de "o automóvel é um produto de venda livre. O consumidor que adquire um carro fá-lo na presunção de que o poderá utilizar, a gosto, nas vias públicas destinadas ao efeito", francamente... Qual é a ligação entre haver liberdade de adquirir um bem e, por isso, dever haver liberdade para fazer o que quiser com ele? Por essa ordem de ideias, também não deveria haver código da estrada (pelo menos para as pessoas que compraram carros em regime de venda livre); e, como as aparelhagens de som também são de venda livre, também não deveria haver limites ao ruído.

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