Friday, January 26, 2007

Re: Economia do Aborto


Para uma mulher, o principal custo de ter um filho é um custo de oportunidade - a penalização sobre a sua carreira profissional e, no limite, a renúncia a uma carreira profissional e aos rendimentos que daí resultariam.

Ter um filho, para uma mulher que tem uma profissão, implica ter de empregar uma pessoa que tome conta dele e ficar ausente do trabalho durante vários meses, perdendo relevância e oportunidades de promoção, para além das faltas que passará a incorrer para levar o filho ao médico ou ficar em casa quando ele está doente. Não é um custo insuportável. Se tiver um segundo filho, a sua situação profissional vai complicar-se, aproximando a fronteira da inviabilidade. Se tiver ainda mais um - o terceiro - é praticamente certo que ela terá de ficar em casa e renunciar à sua carreira e vencimentos durante um certo número de anos.
Para uma mulher que já esteja em casa, este custo de renúncia é zero; para outra que ganhe o salário mínimo, este custo é o salário mínimo; para outra que ganhe dois mil euros por mês o custo é de dois mil euros por mês.

Dai, Pedro Arroja deduz que, para as mulheres de classe média, o custo de ter filhos é maior do que para as de classe baixa, logo estas (as de classe média) tenderão a ser as maiores "consumidoras de abortos" (e, portanto, as maiores interessadas na sua legalização).

Neste post vou-me concentrar sobretudo nos argumentos lógicos de Arroja, não se eles correspondem ou não em estatisticas do mundo real.

No entanto, refiro que é falso que se uma mulher tiver 3 filhos terá que renunciar à sua carreira profissional, mesmo que seja apenas durante algum tempo - a minha mãe teve 3 filhos e nunca interrompeu a sua carreira profissional por causa disso. Conheço pelo menos mais três mulheres que não acharam ter 3 filhos motivo para abandonarem a carreira profissional.

Após este aparte, vamos lá analisar a lógica do raciocinio de Arroja. Em primeiro lugar, o custo de oportunidade de ter um filho não é tão linearmente ligado ao rendimento potencial da mulher como tudo isso (cresce com um rendimento sim, mas não de forma tão directamente proporcional). Imagine-se que o custo de pagar a alguém para tomar conta de um filho é de 200 euros por mês. Se uma mulher tiver um rendimento mensal de 400 euros, qual serão os custos de cuidar dos filhos?

1 filho ........... 200 euros
2 ou mais filhos...........400 euros (porque, a partir de 2 filhos, sai mais rentável ficar ela a cuidar deles)

Se ganhar 1000 euros, até 5 filhos o custo será de 200 euros por filho, a partir dai estabiliza nos 1000 euros.

Assim, seja qual for o rendimento potencial da mulher, o custo de tomar conta de um filho adicional será sempre entre 200 e zero (embora é verdade que, quanto menor o rendimento, mais depressa se atinge o patamar em que o custo marginal é zero) - de qualquer forma, para as mulheres empregadas da classe baixa o custo de tomar conta de mais um filho não é muito diferente do que para as mulheres de classe média (em compensação, para as domésticas tomar conta de um filho adicional é muitíssimo mais barato - zero - do que para as empregadas, independentemente da classe social).

Também convém referir que, nos meios socio-económicos mais favorecidos a diferença de idade entre as gerações é mais elevada (já que demoram mais tempo a estudar, logo têm filhos mais tarde), de forma que as mulheres de classe média talvez possam mais facilmente pôr os filhos em casa dos avós (já que é maior a probabilidade de estes já estarem reformados).

Além disso, há também os custos de manutenção dos filhos e esses também tendem a crescer menos que proporcionalmente - uma mãe com um rendimento de mil euros pode gastar mais dinheiro em alimentação, roupas, etc. para os filhos do que uma que ganhe 400 euros, mas gastará 2,5 vezes mais? Penso que não.

Assim, se o custo com um filho adicional (o custo de oportunidade + custos de manutenção) não cresce necessariamente de forma proporcional ao rendimento, isso significa que o custo relativo (i.e., o custo em proporção do rendimento) de ter mais um filho pode, em muitos casos, ser maior na classe baixa, logo as mulheres dessa classe terem uma maior motivação económica para fazer um aborto (no fundo, quando menos dinheiro se tiver, maior, em termos comparativos, parecerá o custo de alimentar mais uma boca face ao custo - nomeadamente "custo ético" - de fazer um aborto).

No comments: