Pode esta auto-classificação ou classificação por terceiros ser definida ou delimitada de alguma forma?
Suponho que existem muitas perspectivas possíveis para o tema, eu proponho uma formulação:
A crença que é possível a cooperação social voluntária como norma de justiça universal e onde o poder de agir sobre os outros por meios violentos ou não consentidos, unilateralmente e sem legitimidade, está ausente, ou pelo menos, é minimizado e controlado.
Sim, existirão muitas formas de cada um definir "poder de agir sobre os outros por meios violentos ou não consentidos, unilateralmente e sem legitimidade". E isso distinguirá os diferentes anarquismos.
Eu creio que uma forma prática de distinguir diferentes "escolas" ou até perspectivas individuais, aqui, como em todo a filosofia ou ciência social é descrever uma posição sobre a moral e a ética definidas neste sentido:
Ética: aquilo que podemos fazer/não fazer sujeito à sanção violenta de terceiros (individual ou comunitária) e independentemente dos julgamentos morais possíveis (o dever fazer/não fazer).
Moral: aquilo que devemos fazer/não fazer, independentemente de podermos não-fazer/fazer, e onde a sanção ou aceitação passará por meios não violentos como as práticas de exclusão/inclusão social (quem o entender).
A importância da Ética revela-se no diferente entendimento sobre o que é o uso da força em legítima defesa (para os anarquistas não-pacifistas). Porque o anarquismo não implica necessariamente pacifismo, embora eu diria, que um pacifista será sempre necessariamente um anarquista, quer o admita ou não. Por outro, existe o tipo de anarquista pacifista armado e que reconhece a arma de defesa como meio legítimo.
Quanto à Moral, o anarquista desejará que cada pessoa e comunidade voluntária possa viver como quer e deseja, e assim haverá em primeira ordem, um dever moral de tolerância.
PS: Mas eu por exemplo, acho que existe pouca tolerância sobre comunidades mais conservadoras e tradicionalistas (como a Igreja) embora estes devam (e eu faço muito por recomendar) concentrar-se nas formas sociais pacíficas de inclusão/exclusão sociais de fazerem valer o seu conservadorismo (coisa que o estado moderno praticamente invalida ao não admitir ou em muito dificultar a discriminação voluntária).
Será inevitável, claro, falar de direito honesto de propriedade individual ou partilhada, e ainda do direito de livre associação e dissociação de uma comunidade.
A democracia tem um problema com o anarquista, o qual eu, repetindo-me, acho, que só pode ser resolvido pela expressa menção em qualquer ordem constitucional formal ou informal, que existe o direito de secessão, o que permite pressupor, que não sendo exercido, existe uma elevada presunção de se constituir uma comunidade voluntária. Nem vejo outra forma prática de legitimar uma qualquer ordem constitucional.
Creio que existem coisas comuns aos vários anarquismos: crítica da banca tal como ela é permitida operar, e que deságua num excesso (artificialmente induzido) de financeirização e concentração de poder, do militarismo, a tolerância por escolhas, a crítica ao corporativismo, a crítica a elites artificiais (cada um julgará a sua como "artificial") e que tomam conta e perpetuam o sistema (e sistema aqui, será a estrutura que mais impede ou dificulta o caminho para a ordem desejada, neste caso, a anárquica).
E deixo aqui uma citação de Tolkien:
2My political opinions lean more and more to Anarchy (philosophically understood, meaning the abolition of control not whiskered men with bombs) — or to ‘unconstitutional’ Monarchy. I would arrest anybody who uses the word State (in any sense other than the inaminate real of England and its inhabitants, a thing that has neither power, rights nor mind); and after a chance of recantation, execute them if they remained obstinate! If we could go back to personal names, it would do a lot of good. Government is an abstract noun meaning the art and process of governing and it should be an offence to write it with a capital G or so to refer to people … The most improper job of any many, even saints (who at any rate were at least unwilling to take it on), is bossing other men. Not one in a million is fit for it, and least of all those who seek the opportunity … There is only one bright spot and that is the growing habit of disgruntled men of dynamating factories and power-stations; I hope that, encouraged now as ‘patriotism’, may remain a habit! But it won’t do any good, if it is not universal.” - J.R.R. Tolkien, letter to his son, 1943 (from The Letters of J.R.R. Tolkien).