Thursday, October 08, 2009

Contra a Criminalização da Imoralidade II


Na sequência do meu post Contra a criminalização da imoralidade.


No banco dos réus: "Não havendo ganho público com a difusão dessa informação, há certamente prejuízo pessoal – do apresentador e das suas “amigas”. Não havendo esse benefício público, a chantagem não pode ser considerada um acto imoral permissível (como será no caso de qualquer Watergate) mas sim um acto criminoso."

Existe um problema com esta formulação. É não considerar os direitos básicos das pessoas como por exemplo o da liberdade de expressão e contratual exercido por meios absolutamente legítimos. As considerações que cada um possa ter sobre o "não-ganho público e a perda pessoal" são meras considerações subjectivas sobre ... moralidade.

E misturar moralidade com direito dá muito mau resultado. Eu poderia considerar imoral os actos de David Letterman e as suas amigas, e considerar até que como contribuindo para um ataque à "família" contribuindo para o decaimento de uma instituição social que quando corre mal gera em média várias formas de disfunção social como as estatísticas parecem amplamente demonstrar. E assim considerando poderia então até concluir que mais actos de chantagem existam neste tipo de casos em concreto podem até contribuir para a sua prevenção.

Diga-se que o risco que se corre hoje em dia contudo não será o da criminalização da imoralidade do ponto de vista conservador, mas de um crescente moralismo puritano colectivista e isso sente-se em vários domínios, um dia será crime fumar (já existem multas e para locais onde por hipótese quer os proprietários que os clientes poderão ser fumadores e não o podem fazer) porque é mau para o sistema nacional de saúde e porque gera perdas na sociedade.

PS: poderia introduzir aqui a questão do aborto, que eu defino como acto altamente imoral mas que poderá ser de direito mesmo para um anarquista socialmente algo conservador como eu, se considerarmos que a propriedade da mãe sobre o seu próprio corpo lhe confere o direito à expulsão do feto (para todos efeitos uma vida para um católico). Sendo assim, é um acto imoral mas de direito. Como tal consistente com a visão da não criminalização da imoralidade. Já tenho mais dificuldade em encontrar consistência na defesa do aborto livre noutras visões que tendem a menosprezar o conceito de propriedade.

PS2: Aliás, tenho como certo, que um dia em que o problema da natalidade cause sérios problemas ao Estado Social, vai existir um reversão do assunto porque vai ser considerado o aborto uma ameaça à sociedade, passando até o próprio Estado a gerir, assim a tecnologia biológica o permita, a natalidade da "sociedade" quem sabe tal com Aldous Huxley o previu. Os fetos passam a desenvolver-se em incubadoras, as mães deixam compulsoriamente de estar sujeitas à "violência" da gravidez dados os riscos para si e criança e por aí adiante.

1 comment:

RPR said...

Tenho sérias dúvidas de que um acto de chantagem por dinheiro possa ser minimizado com o argumento da liberdade de expressão. Aliás, a propósito de um dito de Thomas Friedman há dias escrevi um texto que ilustra como uma definição maximalista de liberdade de expressão me é caro: http://bancodosreus.wordpress.com/2009/10/09/nao-prendam-a-cotovia/.

Também me parece discutível a ideia da moral subjectiva. Considero que há, em casos como este, uma linha divisória entre bem e mal que é intuível. Aliás, se não o fosse não só não teria havido chantagem (o chantagista sabia que o que fazia era errado) como a polícia não teria intervindo (Letterman só chamou a polícia porque a ameaça o beliscou).

«Poderia então até concluir que mais actos de chantagem existam neste tipo de casos em concreto podem até contribuir para a sua prevenção.» - Cheguei à mesma conclusão ontem (provavelmente depois de este seu texto ter sido publicado) e escrevi isto: http://bancodosreus.wordpress.com/2009/10/09/ganho-social-perda-pessoal-2/.