O que diriam os comentadores se o governo limitasse o tamanho dos pacotes de leite a um máximo de meio litro?Se os consumidores já tivessem contratos assinados com os fornecedores, estabelecendo um preço X por um pacote de leite, o ponto 5 faria todo o sentido (suspeito que a ideia do João Miranda é algo do género - "estes 5 pontos são disparates - as pessoas simplesmente passariam a comprar o dobro dos pacotes e cada pacote passaria a valer metade do preço; em termos reais nada se alteraria, apenas as unidades nominais"; mas isso não se aplicaria no caso de contratos de compra e venda que já tivessem sido assinados, em que a alteração do tamanho do pacote de leite iria representar uma alteração real ao contrato).
Qualquer coisa como:
1. As pessoas vão ser forçadas a beber menos leite.
2. Os casos de osteoporose vão aumentar.
3. Os idosos e as crianças deviam poder comprar pacotes de 1 litro porque precisam mais de cálcio.
4. Agora quando se consome meio litro o pacote acaba e não há mais leite. Dantes ainda se podia consumir mais meio litro.
5. Agora pelo mesmo preço vamos ter metade do leite.
Bem, e isto vem a propósito do quê? Suspeito (até pela sequência dos posts) que pretende ser uma ilustração de uma teoria que o JM vem defendendo há várias semanas - que o aumento do horário de trabalho em mais meia hora significa apenas uma redução do salário mínimo. Para contratos de trabalho estabelecidos depois de o aumento de meia hora ser anunciado, até é capaz de ter razão - como empregador e empregado já sabem que o empregador pode exigir mais meia hora de trabalho, o contrato já vai ser negociado tendo isso em atenção (ou estabelecendo um ordenado maior, ou um horário base mais reduzido), e o único mudança real é que será possivel contratar 42,5 horas e meia de trabalho semanal por 485 euros (um contrato que seria ilegal anteriormente mas agora passa a ser permitido).
Mas é aí que está a grande diferença entre o mercado de trabalho e o mercado de pacotes de leite - enquanto no mercado de pacotes de leite quase nem devem existir contratos estabelecidos a longo prazo (suspeito que mesmo os contratos entre supermercados e produtoras de leite estejam denominados em litros e não em pacotes), a maior parte das pessoas trabalha ao abrigo de contratos pré-determinados, logo, pelo menos a curto/médio-prazo, esta lei irá representar uma alteração efectiva a milhões de contratos já existentes (e como esta lei é apresentado como sendo "de emergência", quer dizer que só é suposta ter mesmo efeitos no curto/médio prazo)
Aliás, faça-se o contraponto com a opinião do João Miranda sobre o horário de Verão , que pelo vistos ele considera uma interferência do Estado nos contratos sem o consentimento das partes - mas no fundo, é uma situação muito semelhante: uma alteração puramente nominal, mas que devido à existência de contratos pré-estabelecidos, acaba por ter consequências na vida real das pessoas (na verdade, se alguma coisa, a critica até faz menos sentido para o horário de Verão, já que essa mudança periódica existe há décadas, logo os contratos já foram assinados tomando isso em consideração).
[Post publicado no Vias de Facto; podem comentar lá se quiserem]