Thursday, December 31, 2009

Considerações sobre as considerações sobre a classe média (II)

Há quem questione o que leva pessoas de esquerda a, por vezes, chamarem "classe média" a quem é na realidade classe média alta ou mesmo alta. A resposta mais simples seria a conversa da "esquerda caviar" mas creio que é algo de mais profundo:

Durante muito tempo o conceito de "classe média" também não era um conceito particularmente positivo para a esquerda - para a esquerda marxista ortodoxa, "classe média" eram os elementos indecisos da luta de classes, que nunca eram de confiança mesmo quando apoiavam o "proletariado"; para aquilo que há 40 e tal anos era a "nova esquerda", a "classe média" era um bando de conformistas/alienados/falsos moralistas/corrompidos pela sociedade de consumo/etc.; de qualquer forma, em nenhuma das tradições a palavra "pequeno-burguês" tem conotações muito boas...

Assim, durante décadas (e ainda mais em reacção às teses - que já eram populares há 50 anos - que diziam que as sociedades ocidentais tinham se tornado sociedades de classes médias e por isso estavam ideologicamente pacificadas) a preocupação dos "intelectuais de esquerda" não era demonstrar que a "verdadeira classe média" eram as pessoas que ganhavam cento e poucos contos (ou o equivalente em valores da época) - era exactamente o oposto: arranjar definições que demonstrassem que a "classe trabalhadora" era cada vez maior e que a "classe média" um grupo não tão grande como se dizia; ou seja, puxar para cima a fronteira entre a "classe trabalhadora" e a "classe média" (diga-se que a própria escolha entre "classe trabalhadora" e "classe baixa" para designar a classe abaixo da "classe média" tem implicações diferentes).

Hoje em dia, essa atitude de desconfiança pela classe média desapareceu e toda a gente quer ser classe média; mas as teorias da estratificação social desenvolvidas nesses tempos continuam a ser as utilizadas e são óptimas para os "esquerdistas" da classe alta e média alta (como eu, que devo ganhar quase o dobro do salário mediano) se convencerem a si próprios de que são classe média (ainda mais em Portugal, que consome "definições de classe média" produzidas em França ou nos EUA).

Note-se que eu não estou a tomar exactamente partido por nenhuma das definições - as minhas prefiridas são esta e esta, mas acho que qualquer uma é boa desde que não haja equívocos sobre o que é que se quer dizer.

Considerações sobre as considerações sobre a classe média (I)

Penso que a grande variedade de definições de classe média tem origem em que há duas "filosofias" bastante diferentes sobre como definir as classes alta, média e baixa - uma define a classe alta e baixa a partir da média, enquanto outra define a classe média a partir da alta e da baixa.

Isto é, a primeira perspectiva vai primeiro definir a classe média (provavelmente identificada com o individuo típico), e depois quem não for possivel encaixar nesse critério é classificada, ou na classe alta ou na baixa.

Na segunda perspectiva, tende-se a ver a sociedade como estruturada há volta da relação entre a "classe alta" e a "classe baixa" (os nomes variam com as tradições: "burguesia" e "proletariado", "elite" e "povo", etc.), estabelece-se um critério para definir essas classes, e depois, quem não for possivel encaixar nessa dicotomia (em principio por nalgumas coisas parecerem-se com a classe baixa e noutras com a classe alta) é considerado a "classe média".

A grande diferença: enquanto na primeira visão, "classe média" tende a ser identificada com o individuo típico, na segunda este frequentemente é classificado (por vezes quase por definição) na "classe baixa" (ou "trabalhadora", ou "popular"...) e "classe média" são as pessoas que estão acima da massa da população mas abaixo da elite dominante - ou seja, a "classe média" de acordo com a segunda visão é mais ou menos equivalente ao que a primeira visão classificaria como classe média-alta (ou mesmo como alta).

Tuesday, December 29, 2009

O culpado dos ciclos económicos: os economistas

"As has been mentioned already, the British Government has asserted that credit expansion has performed "the miracle...of turning a stone into bread." [11] A Chairman of the Federal Reserve Bank of New York has declared that "final freedom from the domestic money market exists for every sovereign national state where there exists an institution which functions in the manner of a modern central bank, and whose currency is not convertible into gold or into some other commodity." [12] Many governments, universities, and institutes of economic research lavishly subsidize publications whose main purpose is to praise the blessings of unbridled credit expansion and to slander all opponents as illintentioned advocates of the selfish interests of usurers." Human Action, Mises

Ainda a respeito do "pago-degradante" e do "de graça-digno"

O comentário de Fernanda Cancio (e o comentário de Rui Passos Rocha ao comentário) lembrou-me deste post de Chris Dillow (se calhar já o postei, mas volto a linká-lo).

Ainda a classe média e as mulheres-a-dias

Muito foi escrito sobre a questão das mulheres-a-dias da classe média. Mas vou também dizer alguma coisa:

Eu considero-me classe média e não tenho mulher-a-dias; os meus pais serão classe média (para alguns) ou alta (para outros) e também não têm mulher-a-dias; as minhas irmãs (eu considero uma delas "classe média") têm ambas mulher-a-dias; penso que nenhuma das pessoas que trabalham no meu gabinete tem mulher-a-dias (no entanto, em salas próximas há pessoas com rendimentos similares com mulher-a-dias).

Agora, a questão que Paulo Pedroso levanta - "porque não hão-de as mulheres-a-dias fazer parte da classe média, com as mesmas expectativas e o mesmo modo de vida dos seus patrões? Se eu compro um serviço que consigo pagar (as tais horas) em que é que o facto de quem mo presta fazer ao fim do mês um salário próximo do meu (que não sou eu que pago) me afecta?" Em abstracto, poderíamos imaginar esse cenário, mas na prática duvido que se verifique - imaginemos que o Joaquim contrata a Carolina de Vasconcellos e Souza para ir lá a casa 3 horas por semana e paga-lhe 20 euros. O que é que isso significa:

1 - Que para o Joaquim a trabalheira de limpar a casa representa um incómodo maior do que o incomodo de gastar 20 euros (se assim não o fosse preferiria fazer ele próprio o trabalho)

2 - Que para a Carolina de Vasconcellos e Souza o beneficio de ganhar 20 euros é maior do que o incómodo de ir limpar a casa do Joaquim (caso contrário, não aceitaria o trabalho)

Ora, porque será que o Joaquim valoriza mais o "não limpar a casa" do que os 20 euros, mas a Carolina valoriza mais os 20 euros do que o "não limpar casas"? Poderá haver várias explicações, mas a mais provável é que a Carolina tenha menos dinheiro que o Joaquim, e por isso valorize mais o dinheiro; outra possivel explicação é que, fazendo outra coisa nessas 3 horas, o Joaquim ganhe mais do que os 20 euros que gasta, o que implica que a remuneração horária do Joaquim seja maior do que a da Carolina. De qualquer maneira, as explicações mais prováveis apontam que, se o Joaquim contrata a Carolina como mulher a dias, é sinal que ganha mais e/ou tem mais dinheiro que a Carolina.

A Fernanda Câncio comenta que, para algumas pessoas, "o trabalho doméstico é degradante se for pago mas digno se for feito de graça"; bem, isso é a velha questão da "alienação do trabalho": é diferente um trabalho que é a expressão da nossa sensibilidade estética (como é em parte limpar/arrumar a nossa casa) dum trabalho que é pôr em prática as ideias dos outros (como é o caso de limpar/arrumar casas alheias); e também é diferente limpar/arrumar a casa umas horitas por dia ou por semana de passar uma vida a arrumar casas, 8 horas por dia, 5 dias por semana.

Saturday, December 26, 2009

Feriados a mais?

A Associação Empresarial de Portugal defende a redução do número de feriados, argumentando que Portugal tem mais 2 feriados que a média da União Europeia. Talvez seja assim, mas há uma coisa que é frequentemente esquecida nesses cálculos: em vários países europeus (como a Espanha e o Reino Unido), os feriados que calham ao Domingo são transferidos para outro dia (em vez de serem perdidos, como em Portugal).

E, hoje, tivemos que aturar de novo as televisões a fazerem contas do género "Em 2010 vai haver X feriados, Y pontes, Z fins de semana, W férias, logo X+Y+Z+W dias em que não se trabalha"; será que não sabem que (a menos que a entidade patronal decida mesmo dar o dia) uma "ponte" mais não é que um dia de férias marcada para aquela data especifica, logo não se pode somar dias de ponte com dias de férias?

Thursday, December 24, 2009

Passatempo

Akinator, the Web Genius - a gente pensa nalguma figura famosa (real ou de ficção) e o "génio" tenta descobrir fazendo-nos perguntas. Com apenas meia dúzia de perguntas bastante anódinas, o programa conseguiu identificar, à primeira tentativa, o James Dean, a "Susan Pevensie", o "Rupert Giles", a "Sarah Sidle" e a Manuela Ferreira Leite, entre outros (precisou de 2 tentativas para identificar a "Duquesa").

O CDS e o subsidio de desemprego

O CDS propõe que, quando uma empresa contrate um desempregado, receba o valor que este iria receber de subsídio. Eu não achei o texto exacto da proposta, mas, se é o que aparece na noticia do Público, dá-me a ideia que é um incentivo para as empresas preferirem contratar alguém que está desempregado há pouco tempo do que há muito, já que o primeiro teria mais subsídios de desemprego a receber.

Tuesday, December 22, 2009

Ainda o 25 de Novembro

Luis Coimbra levantou alguns pontos interessantes em "A «esquerda revolucionária» e Jaime Neves":

"Na URSS o Partido Comunista procedeu ao fuzilamento de todos os "desvios esquerditas" que tinham participado na revolução.

Durante a guerra civil de Espanha, nos anos 30, o mesmo aconteceu em muitas zonas controladas pelo PCE, designadamente na Catalunha.

Em 1940 Trostsky - o fundador do Exército Vermelho -foi asssassinado no México a mando de Staline.

(...)

Sem a democracia que Ramalho Eanes, Jaime Neves e até mesmo Vasco Lourenço ou Melo Antunes ajudaram pela força a instaurar, obrigando o PCP a deixar-se de veleidades golpistas e a respeitar os resultados eleitorais, os Deputados do Bloco não estariam hoje na Assembleia da República, mas a adubar um qualquer cemitério."
Custa-me a reconhecer, mas provavelmente Luis Coimbra tem alguma razão. Se uma coligação gonçalvista/otelista tivesse tomado o poder em Portugal, imagino que a evolução dos acontecimentos seria algo do género:

A- Começam a surgir tensões nas fábricas, quarteis e escolas, com os plenários de soldados, as comissões de trabalhadores e as associações de estudantes a quererem continuar os hábitos do PREC, e os "oficiais revolucionários", os "gestores revolucionários" e parte dos "professores revolucionários" a defenderem a "disciplina revolucionária" (nesse aspecto penso que não seria muito diferente dos primeiros governos de Vasco Gonçalves)

B - Em principio, a ala comunista/gonçalvista acabaria por ser a dominante no novo "Conselho da Revolução", já que tenderiam a agir em bloco, enquanto os radicais de esquerda eram um grupo mais inorgânico; asim, sempre que alguma coisa fosse votada no CR, provavelmente a ala comunista/gonçalvista ganharia

C - Assim, sempre que os conflitos previstos em A tivessem que ser decididos pelo CR, a decisão seria favorável aos oficiais, gestores, etc. levando ao desencanto das bases (que para alguns levaria à apatia e outros à insoburdinação contra o novo governo)

D - aproveitando-se da perca de entusiasmo dos "otelistas", ao fim de algum tempo seria convocada uma Assembleia do MFA que escolheria um novo CR, agora com o PCP claramente maioritário e só um outro "otelista" (provavelmente o próprio) para compor o ramalhete

E - Agora, com o PCP claramente no comando, era só esperar por alguma "acto de indisciplina" num quartel, ou alguma protesto estudantil ilegal nalguma escola, ou coisa de género - o CR ordenaria a prisão dos "elementos contra-revolucionários"/"provocadores ao serviço da reacção" directamente envolvidos; após alguns dias, seria emitido uma nota oficiosa informando da descoberta de uma "rede clandestina empenhada em sabotar o processo revolucionário" enquanto algumas unidades militares fariam, de surpresa, centenas ou milhares de detenções.

[ver o que se passou pouco depois na Etiópia, um país também governado por "militares progressistas"]

Mas não poderia ser ao contrário? A "esquerda revolucionária" a triunfar [já agora, e já que fui buscar o exemplo etíope, foi em parte o que acabou por aconter lá, ao fim de quase 20 anos de guerra civil...]?

Bem, é sempre dificil fazer estas especulações "o que teria acontecido se não tivesse acontecido o que aconteceu" - afinal, o PCP e a extrema-esquerda só poderiam ter triunfado em 1975 se a relação de forças no país fosse diferente, mas nessa "história alternativa" a relação de forças entre o PC e a extrema-esquerda provavelmente também seria diferente.

Por outro lado, se tivesse sido Jaime Neves a ter a última palavra no 25 de Novembro em vez de Melo Antunes ou Vasco Lourenço, se calhar os deputados do BE também não estariam no parlamento...

A fisica de uma batalha espacial

The Physics of Space Battles

Monday, December 21, 2009

Desigualdade e Inovação

Inequality & innovation, por Chris Dillow:


Why did the industrial revolution occur so late in human history? It’s not simply because we had to wait for the science. The steam engine, for example, was invented in the first century AD. But it was another 18 centuries before it became widely applied. Why the wait?

[T]his new paper suggests, though doesn’t explicitly articulate, another possibility - that inequality held back the economy.

Roughly speaking, there are two sorts of technical progress. One is the introduction of new products. This is helped by inequality - because this implies that there’s a pool of wealthy customers for the new goods.

But there’s another sort - process innovation, the introduction of new techniques that allow goods to be produced more cheaply for a mass market. And this form of innovation is retarded by inequality. After all, if the majority of people are on the breadline, or working in subsistence farming, producers have little incentive to finds ways of making new goods cheaper, because people still won’t be able to afford them.

In this sense, process innovation - which is what the industrial revolution was - requires there to be a middle-income market, which in turn requires at least a little equality.Now, I’ll grant that it’s tricky to test this hypothesis against the evidence.

(...)

As I say, it’s just a suggestion than inequality retarded the industrial revolution. (Of course, there‘s no reason why the explanation be mono-causal). But if there’s any truth in this, then it implies that the cost of inequality, historically speaking, has been colossal. Delaying the transition from zero growth to 2% per capita growth by 100 years means denying people a seven-fold improvement in their real incomes.

O mecanismo que Dillow sugere aqui é sobretudo pelo lado da procura - quanto maior a igualdade nos rendimentos, maior o mercado para a produção em massa, logo maior o incentivo para as empresas adoptarem inovações que aumentem a produtividade do trabalho. Mas eu acho que há também um incentivo pelo "lado da oferta", por assim dizer - uma distribuição mais igualitária do rendimento e da riqueza costuma estar associada a salários relativamente altos e/ou mesmo a falta de mão de obra, logo mais têm as empresas a ganhar com a introdução de inovações que aumentem a produtividade do trabalho.

Um exemplo - imagine-se uma empresa em que metade da receita vai para as matérias-primas, um quarto para pagar ordenados e um quarto para lucros; se essa empresa adoptar uma nova tecnologia que duplique a produtividade do trabalho, isso permite, ou um aumento dos lucros em 50%, ou uma redução dos preços em 12,5%.

Agora imagine-se que as receitas vão metade para matérias-primas, 40% para lucros, e apenas 10% para salários; nesse caso, se a produtividade do trabalho duplicar, o lucro aumenta em apenas 12,5% (ou os preços reduzem-se em 5%).

Friday, December 18, 2009

Um momento importante?

Muita gente anda a considerar como um momento importante o governo ter decidido apresentar uma proposta de legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

A mim parece-me que o "momento importante" será a aprovação da lei na Assembleia da República - pelo menos do ponto de vista formal, o governo ter decidido apresentar um proposta de lei vale tanto como a Comissão Politica do PEV ter decidido apresentar um proposta de lei sobre o mesmo assunto.

Às vezes há uma tendência para se esquecer que o governo não faz leis...

Sugestões de leitura

The Harvard-Goldman Filter, por Arnold Klin

Inflation & gold, por Chris Dillow

Thursday, December 17, 2009

Fim do casamento heterossexual iria poupar biliões de euros aos portugueses


Ora, em Portugal deve haver alguns milhões de heterossexuais casados; provavelmente apenas uma pequena minoria dos homossexuais se irão casar (de acordo com as estimativas dos opositores ao CPMS); logo provavelmente o rácio "casamentos heterossexuais"/"casamentos homossexuais" será na ordem das dezenas de milhar. Se as despesas que o casamento homossexual implica serão de "milhões", então o casamento heterossexual tem despesas de dezenas ou centenas de milhares de milhões de euros - talvez chegue ao bilião de euros (se usarmos a convenção norte-americana, teremos carradas de biliões em despesa, talvez até chegue ao trilião).

O movimento não-violento que deteve (em parte) os exércitos de Hitler

Danish, Norwegian, and Dutch resistance to Nazism from 1940 to 1945 was
pronounced and fairly successful. In Norway, for example, teachers refused to
promote fascism in the schools. For this, the Nazis imprisoned a thousand
teachers. But, the remaining teachers stood firm, giving anti-fascist
instruction to children and teaching in their homes. This policy made the
pro-fascist Quisling government so unpopular that it eventually released all of
the imprisoned teachers and dropped its attempt to dominate the schools. … In
Copenhagen, Danes used a general strike to liberalize martial law. …

But, surely the most amazing but widely neglected case of nonviolent resistance
against Nazi Germany was the protection of Jews and other persecuted minorities
from deportation, imprisonment, and murder. … Gene Sharp shows how the nations
which nonviolently resisted National Socialist racial persecutions saved almost
all of their Jews, while Jews in other Nazi-controlled nations were vastly more
likely to be placed in concentration camps and killed. The effort to arrest
Norway’s seventeen hundred Jews sparked internal resistance and protest
resignations; most of the Norwegian Jews fled to Sweden. … When Himmler tried to
crack down on Danish Jews, the Danes thwarted his efforts. Not only did the
Danish government and people resist – through bureaucratic slowdowns and
noncooperation – but, surprisingly, the German commander in Denmark also refused to help organize Jewish deportations. This prompted Himmler to import special
troops to arrest Jews. But, in the end almost all Danish Jews escaped unharmed.

Acerca dos judeus na Dinamarca - li algures que toda a gente na Dinamarca começou a usar a estrela amarela, tornando impossivel identificar os judeus, mas afinal é boato (embora "incorrecto nos detalhes, mas correcto no espírito").

Da última vez que Banqueiros Centrais & Co salvaram o mundo


Rubin (à esquerda, aclamado académico e profissional, secretário do Tesouro durante a era Clinton) não só não conseguiu salvar o mundo como conseguiu ajudar a destruir o Citigroup. Quanto a Alan Greenspan seguiu à risco o conselho de Krugman em 2002 : "Alan Greenspan needs to create a housing bubble to replace the Nasdaq bubble", depois continuado por Bernanke, agora nomeado Salvador-do-Mundo-in-Chief. (Foto via LRCBlog)

Wednesday, December 16, 2009

Secessão (II)


O governo escocês quer organizar um referendo sobre a independência; provavelmente não vai haver referendo nenhum, já que os partidos pró-União (Trabalhistas, Liberais e Conservadores) têm a maioria no parlamento escocês, e, de qualquer maneira, parece que as sondagens não dão grande apoio à independência (aliás, fazer um referendo à independência quando os partidos mais ou menos independentistas nem sequer tiveram a maioria dos votos não me parece lá grande ideia).

No entanto, se os Conservadores (que não são muito populares na Escócia) ganharem as próximos eleições britânicas (e o Reino Unido tiver um primeiro-ministro nascido em Londres após 2 anos de Glasgow e 10 de Edimburgo), talvez o sentimento separatista aumente.



Na hipotese altamente improvável de a Escócia se tornar independente, talvez tenhamos uma "secessão de 2º grau" nas ilhas Shetland.

As Shetland pertenciam à Dinamarca, mas há uns séculos uma princesa dinamarquesa casou-se com o rei da Escócia e, enquanto o rei da Dinamarca não pagava o dote, deu as Shetland como penhor; o dote acabou por ser pago, mas a Escócia não devolveu as ilhas (repare-se que a bandeira das Shetland é uma combinação das cores escocesas e do desenho escandinavo).

Actualmente há um movimento independentista nas Shetland, alimentado sobretudo por duas razões: o petróleo (grande parte do petróleo "escocês" - que por sua vez é quase todo o petróleo "britânico" - é na verdade "zetlandês") e o peixe (aí a questão não é tanto a integração das Shetland na Escócia ou no Reino Unido; é mais a integração na União Europeia - é também por essa razão que os "vizinhos" da Noruega e de grande parte da Dinamarca não aderem à UE).

Curiosamente, o Scottish National Party não se tem oposto aos separatistas zetlandeses, tendo já dito que, se a Escócia se tornar independente, as Shetland terão o direito à auto-determinação; digo que isto é "curioso" porque, normalmente, a segunda coisa que um movimento separatista faz é, após obter a independência, proclamar que "a pátria é una e indivisivel".

De Agosto a Dezembro


Monday, December 14, 2009

Secessão

El 'sí' a la independencia arrasa con el 94,71% y piden referendo vinculante

El 'sí' a la independencia de Cataluña se ha impuesto hoy con claridad en las consultas celebradas en 166 municipios catalanes al obtener un 94,71% de los votos, lo que ha llevado a la plataforma organizadora a anunciar que pedirá ahora que el Parlament permita un "referéndum vinculante" para el 25 de abril.

Según los datos de la Coordinadora Nacional de las consultas, que han tenido una participación que no llega al 30% del censo, el 'no' ha logrado un 3,53%, y ha habido un 1,76% de votos en blanco y un 0,34% de nulos. (
via )

Sunday, December 13, 2009

Pobreza e crime

Chris Dillow:
The paradox is this. When it comes to tax, the right are keen to stress that people respond to incentives. And yet when it comes to crime they seem coy about incentives, and prefer to talk about multiculturalism“ or genes.

The paradox is especially strong because economic theory is much clearer on the link between poverty and crime than between tax rates and tax revenue.
Justificar completamente
This is because in the case of taxes, the income and substitution effects work in opposite ways. The substitution effect causes people to prefer leisure over work when taxes rise, whilst the income effect causes them to want to work more to recoup lost income. However, with crime the two work in the same direction. The income effect causes a poor person to turn to crime to raise money, whilst the substitution effect means the unemployed have more time with which to commit crime, and lower penalties - no danger of losing one‘s job - for doing so.

Unsurprisingly, therefore, the empirical evidence is much stronger for a link between relative poverty or inequality (pdf) and crime than it is for a link between tax rates and revenues.

O "principio de Dilbert" explicado pela economia?

Um paper do Departamento de Economia da Universidade de Bona argumentado que numa organização os lugares de topo tenderão a ser ocupados pelos individuos com menos capacidades:

Competitive Careers as a Way to Mediocracy
We show that in competitive careers based on individual performance the least productive individuals may have the highest probabilities to be promoted to top positions. These individuals have the lowest fall-back positions and, hence, the highest incentives to succeed in career contests. This detrimental incentive effect exists irrespective of whether effort and talent are substitutes or complements in the underlying contest-success function. However, in case of complements the incentive effect may be be outweighed by a productivity effect that favors high effort choices by the more talented individual
Após ter lido o paper, confesso que continuei a não perceber muito bem a teoria do autor, mas enfim...

[Chris Dillow - e creio que também o autor - refere-se a isso como o "Principio de Peter", mas não concordo: o "Principio de Peter" diz é que os trabalhadores competentes vão sendo promovidos até estabilizarem num lugar em que deixam de ser competentes; aqui estamos a falar de serem promovidos os trabalhadores que logo à partida têm menos capacidades, algo que tem mais a ver como o chamado "Principio de Dilbert"]

Thursday, December 10, 2009

A "classe média" II

Vamos lá tentar definir mais "cientificamente" quem é classe média.

De acordo com um cálculo qualquer do Banco Mundial [pdf], o rendimento per capita de Portugal, em 2008, seria de 20.560 dólares. À partida, isso poderia significar que cada português tem, em média, esse rendimento; no entanto, esse valor é calculado dividindo o rendimento nacional pela população total, incluindo as crianças. Os menores de 15 anos são 16,3% da população; se considerarmos que apenas os outros 83,7% têm rendimentos relevantes, podemos considerar que o rendimento médio do português com mais de 14 anos é de 24.563,92 dólares (=20.560/0,837). Convertendo para euros a uma taxa de 1 USD = 0,677 EUR, teremos pouco mais de 16.500 euros por ano, ou cerca de 1.180 euros por mês.

Diga-se que, no ano passado, segundo o papelinho do IRS, eu ganhei 18.682,16 euros, o que me põe ligeiramente acima da média .

Claro que isto não basta para definir a classe média - já se estabeleceu que a média é para aí 16.500 euros/ano, mas qual será o intervalo da classe média? Dos 16.000 aos 17.000?15.000 aos 18.000? 13.000 aos 20.000? Eu inclino-me para que a "classe média" seja entre 10.000 e 23.000 euros por ano (mas a escolha dos 10.000 como limite mínimo deve ser mais fetichismo pelos números redondos que outra coisa qualquer)

Mas, seja como for, não tenho grandes dúvidas em excluir da classe média os rendimentos anuais superiores a 33.000 euros (o dobro do rendimento médio).

É verdade que grande parte dos trabalhadores portugueses terá rendimentos abaixo deste intervalo (10.000-23.000), mas também não é forçoso que a classe média tenha que ser uma percentagem significativa da população, ou que o "português típico" (e ainda menos o "trabalhador típico") tenha que ficar na "classe média" (afinal, a média não é necessariamente igual à moda nem a mediana); aliás, se fossemos pelo esquema fora de moda que vê a "classe média" como o grupo que ocupa a posição intermédia entre os "trabalhadores" e os "capitalistas", quase por definição só uma minoria dos trabalhadores assalariados poderia ser "classe média".

Wednesday, December 09, 2009

Minaretes na Suiça e prédios na ilha de Faro


Não (porquê? entre outras razões, porque prefiro a "ilha" de Faro sem arranha-céus tipo Dubai). Mas (pelo menos num contexto social de propriedade privada dos imóveis) isso é realmente um restrição à liberdade de quem tem um terreno na Ilha de Faro - recordo que a conversa surgiu após alguém n'O Insurgente ter perguntado "qual é exactamente a liberdade individual que a decisão de proibir a construção de minaretes desrespeita?" e eu ter respondido/perguntado "a liberdade de construir minaretes?".

E, como já foi dito por algumas pessoas nos comentários, uma coisa é uma regra geral e abstracta proibindo construções com dadas caracteristicas, como altura, volume, etc.; outra coisa é uma lei dirigida a um grupo especifico (neste casdo, religioso) - afinal, continuam a ser legais (ou, pelo menos, a não ser ilegais) construções com uma forma "tipo minarete", desde que não sejam minarates (p.ex., imagino que uma igreja católica possa construir um campanário).

[Uma divagação - durante algum tempo, o padre do que seria a minha paróquia se eu fosse católico dava missa numa fábrica desactivada; de acordo com a nova lei suíça, como seria se um imã decidisse instalar uma mesquita numa fábrica desactivada como as que havia em Portimão?]

Escândalos financeiros na Venezuela

Venezuelan President Hugo Chávez on Monday cast his country's banking crisis as part of a campaign to root out corruption, trying to turn the scandal to his advantage as a recession, inflation and crime erode his popular support.

Over the past week, the government has closed seven small banks -- accounting for between 8% and 12% of deposits in the country's banking system -- on charges that the banks were fraudulently run by their owners, many of whom have close ties to the Chávez administration.

Over the weekend, the crisis claimed its highest-profile victim with the resignation of Jesse Chacón, one of Mr. Chávez's closest allies, from the post of science and technology minister. Mr. Chacón's brother Arné was arrested Saturday in connection with the unfolding crisis. Neither Jesse nor Arné Chacón could be reached for comment.

(...)

The crisis has shed light on a new class of rich people who have made money thanks to close ties to the government. In the local media, they are often referred to as "Boligarchs," or "Bolibourgeois," a play on the phrase "Bolivarian Revolution," coined by Mr. Chávez in honor of South American independence hero Simón Bolívar.

Last month, Venezuela was named the second-most-corrupt nation in the Western Hemisphere after Haiti, according to the 2009 corruption perception index from Transparency International, a nongovernmental organization that campaigns against corruption.

Analysts say Mr. Chávez, who has remained in power for more than a decade, could turn a bad situation to his advantage if he persuades Venezuelans he is serious about a crackdown.

"Chávez is now engaging in damage control, spinning this as an anticorruption drive, and that could sell politically," said Patrick Esteruelas, an analyst with political consultancy Eurasia Group.

Tuesday, December 08, 2009

Dobrar as emissões de CO2 seria bom para as plantas?

Provavelmente não - as plantas consomem CO2 e água (e também nitratos, fosfatos, etc., mas vamos deixá-los de lado), creio que a um rácio de uma molécula de água para uma molécula de CO2

[mais exactamente:

2nH2O + [luz solar] » 2nH2 + 2nO2
2nH2 + nCO2 » CnH2nOn + nH2O]

Como a água e o CO2 são, para as plantas, "bens complementares", duplicar o CO2 na atmosfera só interessaria se se duplicasse também a água disponível para rega (coisa que deve ser difícil). Na verdade, eu suspeito que, actualmente, o "alimento" cuja grau de escassez determina o crescimento das plantas é já a água (afinal, basta ver como as diferenças de vegetação entre zonas geográficas e épocas do ano estão bastante ligadas às diferenças de humidade).

Recomendação "científica": Dobrar a emissão de CO2, o alimento das plantas

Guru Of Science Czar Holdren Called For Doubling CO2 Emissions

Paul Joseph Watson, Prison Planet.com, Tuesday, December 8, 2009

The guru of President Barack Obama’s science advisor, John P. Holdren, who in his 1977 book Ecoscience called for draconian population control measures including sterilizing the water supply and introducing forced abortions, wrote that large amounts of carbon dioxide should be pumped into the atmosphere in order to aid plant growth and solve the food crisis.

Assembleias Constituintes

Do post do MM a pergunta que seria feita no caso Honduras: "¿Está de acuerdo que en las elecciones generales de 2009 se instale una cuarta urna en la cual el pueblo decida la convocatoria a una asamblea nacional constituyente?"


Por muito que custe a muitos ou poucos, referendar a possibilidade de eleger uma Assembleia Constituinte que poderá alterar a Constituição será sempre legítimo em qualquer ordem constitucional e a qualquer momento, se é aconselhável ou não é outra questão. A possibilidade de alterar uma ordem constitucional por vontade de quem nela participa, na própria presunção de legitimidade democrática (a participação voluntária) está acima de qualquer consideração pós-a-presente-ordem -constitucional. É um pouco como a discussão dos "contratos de escravidão" na teoria libertarian, A pode até fazer com B um tal contrato e agir como se fosse escravo de B, mas A pode a qualquer momento evocar o seu direito a não o ser sem estar sujeito a legítima defesa por B. Assim, podemos participar numa dada ordem constitucional que nos obriga a isto ou aquilo (nomeadamente estar sujeito a expropriação de propriedade ou rendimentos por vontade da maioria - caso dos impostos progressivos), mas isso será assim enquanto vemos utilidade na participação em tal sistema maioritário e no limite ordem política. Se tem de existir presunção de uma dada ordem constitucional ser unânime (nem que seja por avaliação , "mal menor"), a capacidade de evocar um novo processo de alteração ou fundação será sempre possibilidade e nenhuma constituição poderá por si mesmo em abstracto como que proibir qualquer alteração futura. Poderá fazê-lo dentro dos mecanismos próprios da actual constituição, mas não tem "força" para impedir a evocação de uma nova assembleia constituinte.

Ao mesmo tempo, o direito de secessão também é paralelamente sempre legítimo, mais uma vez, para presumirmos a legitimidade democrática de decisões maioritárias. No limite, uma comunidade (com as dificuldades de ordem territorial que isso poderá trazer) poderia não estando de acordo como referendo, evocar a separação e formar a sua própria ordem constitucional e assim soberania.

Miguel Sousa Tavares e as Honduras

N'O Expresso, Miguel Sousa Tavares escreve que "Manuel Zelaya (...) congeminou em Junho o clássico plano inventado por Chavéz, de fazer um referendo, que lhe permitisse alterar a constituição e candadatar-se a um segundo mandato".

Recordo que a pergunta do tal referendo que Zelaya tentou organizar era "¿Está de acuerdo que en las elecciones generales de 2009 se instale una cuarta urna en la cual el pueblo decida la convocatoria a una asamblea nacional constituyente?"; ou seja, a questão a referendar era se, no dia das eleições gerais (as tais que ocorreram na semana passada) deveria também ser votada a eleição de uma assembleia constituinte. Ora, tal nunca poderia servir para Zelaya se candidatar a um segundo mandato, como MST escreve: mesmo que a tal constituinte retirasse a proibição constitucional da reeleição, isso ocorreria já sob um novo presidente.

MST de seguida escreve "a sua tentativa foi (...) objecto de uma queixa crime intentada pelo ministério público hondurenho, que culminou com uma sentença de destituição do presidente, decretada pelo Supremo Tribunal. Em consequência, o Supremo Tribunal ordenou às Forças Armadas que executassem a sentença, depondo o Presidente".

O que diz o Código do Processo Penal hondurenho sobre processos contra "altos funcionários"? De acordo com a última alteração, que o Supremo Tribunal nomeará um dos seus magistrados para fazer a instrução do processo; depois, outros 3 juízes do Supremo julgarão o caso, havendo recurso da sentença para o plenário do Tribunal.

Ora, praticamente nada disto foi seguido - entre a acusação contra Zelaya e a sua destituição foi um processo quase instantâneo: o Tribunal nomeou um juiz para fazer os tais procedimentos iniciais e ordenou ao exército que detivesse Zelaya [ver página 2, ponto 8 - PDF]; após ser detido pelo exército o presidente foi de seguida despachado para a Costa Rica, sem ser submetido às fases seguintes do processo nem poder apresentar a sua defesa, o que torna a sua destituição aparentemente ilegal (aliás, quando o Congresso elegeu Micheletti presidente interino, fê-lo com base numa alegada carta de demissão de Zelaya - que este nega - não em nenhuma sentença judicial).

Coisas que se encontram ao procurar pelas chaves nos bolsos

[já agora, um dia destes talvez saia um post sobre a questão de a educação ter ou não externalidades positivas]

Monday, December 07, 2009

A "classe média"

A partir do conceito de "classe média", surgiu uma espécie de discussão entre o Luis Aguiar-Conraria e a Fernanda Câncio (embora a discussão pareça-me ter-se desviado para questões tangenciais).

O que me questiono é se, num país como Portugal, o próprio conceito de "classe média" terá grande utilidade: das duas uma, ou adoptamos um conceito restrito de "classe média", e aí a "classe média" portuguesa será uma minoria residual (comparável talvez aos imigrantes dos PALOP em peso demográfico), ou então adoptamos um conceito tão lato de "classe média" que a diferença entre a "classe média" e a "classe baixa" torna-se largamente artificial (p.ex., podemos definir que até 750 euros de rendimento mensal é-se "classe baixa" e dos 750 aos 5.000 é-se "classe média", mais aí as diferenças dentro da "classe média" serão muito maiores do que entre a familia típica de "classe média" - que terá um rendimento pouco acima dos 750 - e a familia típica de "classe baixa").

Será que essa mania de falar da "classe média" por tudo e por nada não será apenas uma tara herdade de alguns sociólogos dos anos 50 e 60, que a dada altura convencionaram que as sociedades ocidentais se tinham tornado "sociedades de classes médias"?

Já posso dizer que fui detido num aeroporto

Bem, foi mais "retido" do que "detido", e só durante um minuto enquanto me revistavam, mas gosto mais do dramatismo de "detido".

[E, já agora, o meu agradecimento ao Miguel Portas, à Marisa Matias e ao Rui Tavares pelo convite]

Monday, November 30, 2009

A proibição dos minaretes na Suiça

Em primeiro lugar, os defensores da liberdade individual (nomeadamente contra as tentativas de banir a religião do espaço público) e da "democracia limitada" parecem muito apáticos a esses respeito - não se lê quase nada no Blasfémias ou n'O Insurgente, e do que se lê nem se percebe bem qual é a opinião dos autores sobre a questão.*

Por outro lado, acerca dos "perigos de referendos que dão à maioria o poder de limitar os direitos de uma minorias" - acho que esse perigo viria tanto de um referendo como de um parlamento eleito pela maioria: em ambos os casos a minoria fica à mercé da maioria. Há efectivamente algo peculiar neste caso suiço - 59% dos eleitores (e até podiam ser 51%) aprovaram uma proposta que implicará mudar a constituição (coisa que normalmente costuma implicar uma maioria qualificada), mas isso não é um problema do recurso ao referendo: nada impediria de haver uma regra determindando que um referendo só poderia mudar a constituição com uma maioria qualificada de 2/3 ou coisa assim (uma analogia: os estatutos da Associação de Estudantes do ISEG só podem ser revistos por 3/4 do plenário dos estudantes).

Finalmente, um dos argumentos para a proibição dos minaretes é que estes não seriam um simbolo religioso mas politico. Bem, e se fossem? Porque razão os simbolos politicos deveriam ter menos liberdade de serem exibidos de que os simbolos religiosos?

31 da Armada em defesa das "ocupações selvagens"?

Henrique Burnay:

Economia de mercado é isto. Uma mulher que compra uma fábrica falida e lhe triplica a facturação, aumenta em mais de 20% o número de trabalhadores e explica que é uma questão de produzir com qualidade o que o mercado quer.

As deslocalizações não se proíbem, evitam-se; não se impedem, contrariam-se.

Alguém que dê uma medalha a Conceição Pinhão, no meio dos monos do costume galardoados no 10 de Junho."

O Henrique Burnay tem mesmo a certeza que "economia de mercado" é isto?

"De trabalhadora a "patroa", a vida de Conceição Pinhão mudou em poucos dias, depois de a fábrica de confecções em que trabalha, em Arcos de Valdevez, ter sido abandonada pelos patrões que a tentaram deslocalizar para o Leste.

O "pesadelo", como faz questão de sublinhar, começou abruptamente a 29 de Novembro de 2004, depois de reunir com os dois sócios, alemães, da empresa, para definir a programação da fábrica em 2005. "Não ficou tudo feito e decidimos continuar a reunião no dia seguinte", lembra. Ao início da noite, foi alertada para as movimentações dos patrões, que estavam já a retirar tecidos e máquinas. "Estava já preparado um camião para levar o recheio para a República Checa."

"Quiseram fazer tudo à socapa, mas nós, que dependemos da fábrica, não deixámos." Alertou os restantes trabalhadores e, concentrados na saída da empresa, acabaram por barrar a retirada do material. "Nunca mais ouvimos falar deles. Tal como na altura não tiveram a coragem de nos dizer quais as intenções para o nosso posto de trabalho, também agora não a têm para aparecer por cá", afirma. Com 43 anos, casada e mãe de um filho, Conceição, que já antes se ocupava da gestão da Confecções Afonso na ausência dos patrões, sente que os 91 postos de trabalho são uma mais-valia pela qual vale a pena lutar. Assumindo o leme que outros abandonaram.

As encomendas não param e a viabilidade da empresa parece garantida. "Sempre acreditei e agora cada vez mais", diz, confiante, lembrando que as contas dos funcionários estão "praticamente em dia", excepção feita ao subsídio de Natal. "Quando fugiram deixaram contas por pagar e o dinheiro não tem dado para tudo."

A produção continua "quase normal", embora Conceição reconheça que "alguns clientes têm dúvidas" sobre o futuro. O que a levou a avançar com a proposta de compra da unidade, por um euro. Existe ainda uma dívida, já negociada, de 80 mil euros à Segurança Social, que se compromete a liquidar." (DN, 01/05/2005)

Ou:

"De facto, Conceição Pinhão tem estado à frente das decisões da empresa, desde que os principais accionistas tentaram deslocalizar a produção para a República Checa, em finais de Novembro passado, mas sem resultado. Trabalhadores (na sua esmagadora maioria, mulheres), familiares e amigos travaram a retirada da matéria-prima da fábrica, impedindo mesmo um camião TIR, matriculado naquele país do Leste europeu, de entrar nos espaços da unidade.

Desde então que as 91 operárias asseguram a produção, revezando-se na vigília da firma. Para que encontrem a fábrica na manhã seguinte como a deixaram na véspera. Aguardam, agora, por resposta à proposta que fizeram, com vista à aquisição da unidade pelo simbólico preço de um euro. A propósito, Conceição Pinhão indicou que o contacto com os accionistas, alemães, tem sido feito por fax. Segundo disse, foi assim que os donos da unidade reclamaram pela matéria-prima, a 1 de Dezembro passado, "ameaçando, mesmo, os operários com processos judiciais". Por fax, enviado para a Alemanha, seguiu, também, a resposta dos operários às reivindicações dos accionistas, bem como a proposta para a compra da empresa, fundada em 1991, por outro empresário, também alemão. Mas quanto a respostas, nada.

Assegurando que a unidade tem "todas as condições" para continuar a funcionar, aquela responsável exemplificou com o facto de a fábrica ter ficado, "de um dia para o outro" sem clientes, fruto do abandono dos accionistas, a quem se destinava considerável parte da produção. "Agilizámos, de imediato, alguns contactos, que se traduziram em encomendas, encontrando-se actualmente a fábrica a produzir a todo o vapor", disse, indicando que, apesar do esforço, não foi ainda possível pagar o subsídio de Natal. "O problema, que continua a assustar alguns clientes, está na posse da empresa. Temem que a encomenda que possam vir a fazer não seja entregue a tempo", considerou, indicando tratar-se da situação que esteve na origem da proposta das operárias. Enquanto gerente, firmou, durante a administração dos accionistas, contratos com clientes, e continua a fazê-lo, observa, para manter a unidade a laborar.

"Já aqui passámos muitas noites e muito frio, mas tem de ser. Pelo menos enquanto vivemos neste impasse", explicou Helena Araújo, de 33 anos, 14 deles passados na unidade. Sustentando que os accionistas "têm de definir uma posição", Cândida Duarte, trabalhadora domiciliada naquele concelho, asseverou "A fábrica tem todas as condições para singrar. Agora, os sócios têm de dizer se querem ou não. Têm de pegar ou largar, porque isto não é vida para ninguém".

Acesso à unidade fabril continua a estar bloqueado

À entrada do cais da unidade fabril, permanece uma pedra com toneladas de peso. "É a garantia que encotrámos para inviabilizar tentativas de retirada do material", explica a gerente da Afonso, Conceição Pinhão, assinalando que as encomendas "saem pela porta principal". No que se refere à entrada de matéria-prima, disse que são os clientes que se responsabilizam pela sua colocação na fábrica, enviando, depois, a unidade, as peças (camisas e blusas) para as respectivas firmas, sedeadas, na sua maioria, na Alemanha e nos Estados Unidos. Referindo-se à proposta para compra da empresa, disse que os accionistas, caso a aceitem, terão de desembolsar 60 mil euros, para pagamento do subsídio de Natal às trabalhadoras. "De nossa parte, responsabilizamo-nos pelo pagamento de todos os encargos, tanto à Segurança Social (à qual a fábrica deve 77 mil euros, estando a dívida "a ser paga, por prestações) como aos fornecedores (de 40 mil euros)", indicou, assinalando que a proposta "tem o apoio" do proprietário do imóvel, que não tem recebido a renda (de três mil euros mensais) desde Novembro passado."(JN, 05/03/2005)

Trabalhadores a não deixarem os patrões transferirem as máquinas (é isso que quer dizer "as deslocalizações não se proíbem, evitam-se"?) e uma trabalhadora a gerir à margem da lei uma empresa alheia durante mais de um ano (desde Novembro de 2004 até Janeiro de 2006)? Não é o que normalmente se chama "economia de mercado" e muito menos de "capitalismo" (foi para isto que se fez o 25 de Novembro?). Será que os actos de "acção directa" e "desobediência civil" dos "31 da Armada" estão-lhes a subir à cabeça?

[Não digo que "economia de mercado" não possa ser efectivamente isto - há um ano, quando uma fábrica em Chicago foi ocupada, houve alguma discussão na internet anarco-capitalista sobre de que lado os defensores do "economia de mercado" deveriam estar mas o argumento-liberal-a-favor-das-ocupações-de-empresas-à-beira-de-fechar parece-me muito fraquinho]

Outros artigos publicados aqui no VS sobre as Confecções Afonso: "Fábrica salva por um euro já factura quase um milhão" e Já agora, em Portugal...

Sunday, November 29, 2009

Livros com brinde


Com a compra do livro "Epidemia" (sobre a gripe de 1918) ganha-se uma máscara anti-infecções.

Imagino que na compra do livro "Os Senhores do Norte", à venda no mesmo sitio, se ganhe uma espada e/ou um arco de lançar flechas (embora não haja qualquer referencia a tal na capa...).

Friday, November 27, 2009

Sobre as eleições nas Honduras

What has transpired in Honduras in recent weeks has eliminated the prospects for free and fair elections. Actions specifically aimed at suppressing political organizing for the election, including mass arrests, illegal detentions, and violence -- documented by respected international groups such as Amnesty International, Human Rights Watch, and the Inter-American Commission on Human Rights -- have yet to be investigated or prosecuted by the Honduran attorney general's office.

(...)

Lists of anti-coup activists have been compiled by local mayors and given to the military. The government's telecommunications commission has continued to block pro-Zelaya media outlets, forcing them to play reruns of old cowboy movies rather than news critical of the coup regime.

All of this while the Micheletti government reinstated a state of siege last weekend and intimidated opponents by announcing that it has trained hundreds of Honduran lawyers to prosecute individuals participating in a boycott of Sunday's vote.

Here's the number Zelaya has to beat: 1.5 million valid votes. Below 1.5 million, there is no doubt that his boycott is a success and no amount of spin that can change that fact for the de facto government. That will mean at least half a million people, 25% of the expected electorate (and possibly more) chose to actively protest by not voting when they would have otherwise. That number would create a legitimacy problem for the next president and almost certainly force a change in action by the de facto government before the inauguration.

Here's the number the de facto government has to beat: 2.4 million valid votes. At 2.4 million, they'll cross the 50% mark in turnout, beat 2005's turnout and be able to proclaim it the highest raw number turnout ever in Honduras. At that point, the boycott is statistically irrelevant and they get to say more people voted than voted when Zelaya was elected in 2005.

Here's a scenario that's likely to happen. The valid vote total number is going to come in somewhere between 1.7 and 2.3 million valid votes. The Zelaya supporters are going to proclaim their boycott a massive success, saying that over 50% of voters didn't show up, the lowest turnout in recent history. The election supporters are going to proclaim the boycott a failure, saying that Zelaya's supporters consisted of less than 10% of voters, maybe 300,000 people who would have voted who didn't show up. Both sides will disagree over the interpretation of the results the same way they have disagreed through this whole process and nobody changes their mind or feels politically pressured to change their actions.

Thursday, November 26, 2009

A vacina contra a gripe e a morte dos fetos (III)

Tanto o meu homónimo miguel como o meu conterrâneo Jorge Candeias notam que não se podem fazer grandes inferências com 4 observações.

Mas repare-se que o raciocínio que apresento aqui não se baseia em 4 observações - baseia-se em 5.000 (o conjunto das grávidas vacinadas).

A vacina contra a gripe e a morte dos fetos (II)

Pelo que tenho ouvido, nas ultimas duas semanas 4 grávidas vacinadas contra a gripe A perderem os bebés.

A resposta das autoridades de saúde é que, de qualquer forma, há cerca de 300 casos desses por ano em Portugal.

Vamos fazer uma contas - vamos aumentar um bocadinho esses 300 e admitir que todos os dias uma grávida perde o bebé em Portugal; assim, em duas semanas haverá uns 15 casos desses.

Hoje sairam os números que eu queria saber e não sabia - a proporção de grávidas vacinadas: em 60.000, cinco mil foram vacinadas (ou seja, 8,34%). Desta forma, se em duas semanas há 15 mortes de fetos, seria de esperar que 1,25 casos desses ocorressem, por simples acaso estatistico, em mulheres vacinadas - ocorreram (creio eu) quatro casos, mais do triplo do esperado.

Vamos fazer outro exercicio - se em duas semanas 15 grávidas tiverem perdido os filhos, e se 5/60 das grávidas do país tiverem sido vacinadas, qual é a probabilidade de 4 de entre essas 15 terem sido vacinadas? Isso é uma distribuição binomial, com 15 tentativas e probabilidade 0,0833... A probabilidade acumulada de 3 ou menos dessas 15 mulheres terem sido vacinadas é de 96,88% [como chegar a este valor em Excel: =DISTRBINOM(3;15;5/60;VERDADEIRO)]. Assim, se não houver ligação entre a vacina e a morte fetal, a probabilidade de (por puro acaso) pelo menos 4 desses casos ocorrerem com mulheres vacinadas seria de apenas 3,12%.

E porque ontem foi 25 de Novembro (II)

Mas vamos continuar com o exercicio de história alternativa - tal como muita gente diz que o mal foi não terem deixado o Jaime Neves "ir até ao fim", também muita gente diz que o PCP "traiu" no 25 de Novembro porque mandou as suas forças recuar (até há quem diga que foi quase um acordo secreto EUA-URSS: "tu ficas com Portugal que eu fico com Angola").

O que teria acontecido se o PCP não tivesse ficado quieto (e, já agora, se o Otelo não tivesse decidido ir dormir)? Aliás, esta questão não é independente da anterior - o PCP retirou em larga medida porque teve garantias implicitas que Jaime Neves não "iria até ao fim".

Bem, tirando isto, eu não tenho nenhuma experiencia militar, logo não posso aferir do valor relativo das diferentes unidades em presença; no entanto, atendendo a que a "esquerda militar" controlava várias unidades em Lisboa, tinha muitos civis armados e tinha base social (e maquinaria pesada) suficiente para erguer barricadas nos pontos estratégicos, penso que os "comandos" de Jaime Neves iriam ter o destino dos cossacos durante a Revolução Russa - muito heroismo, muita reputação de tropa de elite, etc., mas o que teriam seria uma derrota (e mortes) gloriosa, nada mais.

Agora, não tenho tanta certeza que isso fosse o principio de uma guerra civil - talvez após a derrota dos comandos, o PS, PSD, "militares moderados", etc. fizessem mais ou menos o que já tinham feito a 11 de Março: dizerem "não tivemos nada a ver com isto" e renogociarem uma nova divisão do poder com o PCP.

Mas caso fossem para a luta, imagino que o resultado seria uma espécie de Comuna de Paris: em pouco tempo as forças revolucionárias seriam cercadas em Lisboa (o deserto a sul do Tejo seria rapidamente controlado) e após um cerco de algumas semanas ou meses, a cidade seria tomada (talvez nesse intermédio fosse possivel uma solução negociada). Note-se que tanto a maioria da população (veja-se os resultados da Constituinte) como a maioria do aparelho militar (veja-se o resultado da assembleia de Tancos uns meses antes) estava do lado moderado/conservador, pelo que o resultado final não oferecia grandes dúvidas.

No cenário de um desfecho violento, o resultado seria parecido ao anterior, mas provavelmente o novo regime acabaria por ser mais abertamente autoritário (mais estilo Indonésia do que Turquia).

E porque ontem foi 25 de Novembro


Bem, em primeiro lugar teriamos cerca de 20% da população alienada do processo politico - e esses 20% seriam a maioria em vastas áreas geográficas do país; p.ex., teriamos cidades inteiras em que a maior parte da população iria considerar o regime vigente ilegitimo.

Alem disso, se olharmos para os resultados das eleições de 1976, e se assumirmos que os eleitores do PCP e afins se iriam abster (era pouco provável que fossem votar no PS ou no MRPP, que até há poucos meses eram "o inimigo"), o resultado possivel seria uma maioria parlamentar de direita (por umas contas que estive fazendo, PSD+CDS poderiam ter tido mais 4 deputados que PS+MRPP).

Assim, além da rejeição da legitimidade do governo por 1/5 da população, era possivel que tivêssemos ainda uma maioria parlamentar de sinal contrário ao que era então a maioria do país.

E estamos a falar de um governo que iria ter que tomar medidas "duras", como a devolução das (ou pelo menos parte) terras alentejanas aos anteriores proprietários.

Ora, como eu acho que já escrevi várias vezes, um governo só manda porque os cidadãos obedecem; e essa obediencia é sempre o resultado de uma mistura de adesão voluntária e de medo. Ora, um governo com pouco adesão voluntária (com 20% da população e uma vasta área geográfica a achar o regime ilegitimo, e talvez com a maioria da população a discordar das suas linhas orientativas) e a ter que tomar medidas impopulares e cujo impacte iria ocorrer sobretudo nas áreas onde a população estaria contra o regime (Alentejo, arredores de Lisboa) teria (quer o quisesse quer não) que recorrer à repressão como meio principal de exercer o poder. Talvez não fosse uma "ditadura" no sentido mais estrito do termo, mas também não seria o que normalmente se considera uma democracia - penso que seria algo parecido à Grécia dos anos 50/60 ou à Turquia até há pouco tempo (é verdade que o período 76-82, com o seu Conselho da Revolução também não era propriamente uma democracia clássica).

Miguel Noronha dá o exemplo de Espanha e do País Basco (para falar a verdade, quando escrevi o meu comentário estava a pensar mais na Irlanda do Norte), mas qual é o nível de análise aí? Se é Espanha, o Batasuna (nas suas diversas encarnações) representa uma minoria infima dos habitantes de Espanha e em área geográfica o Pais Basco também é uma pequena parcela de Espanha. Se a análise é feita ao nível do Pais Basco, é questionável a democraticidade de uma situação em que os partidos "espanholistas" governam um território provavelmente graças apenas à ilegalização do Batasuna e dos seus heterónimos (enquanto estes poderam concorrer, os partidos autonomistas e/ou separatistas tiveram sempre a maioria dos votos).